Nota do autor.
Este é o primeiro conto publicado aqui
no Escritor com R que realmente tem uma capa, além de ser ilustrado. Assim fica
clara, além de qualquer dúvida, a natureza da história. Então, se você tem
algum problema com mulheres de pouca roupa em situações permeadas de
sensualidade e suspense, é preferível que não siga adiante.
O aviso está dado, reclamações e mimimis
serão sumariamente excluídos.
Quem tiver mente aberta e procura uma
boa história, por outro lado, espero que se divirta.
Obrigado.
Tatiana desde o começo não havia gostado da sugestão de Daniel.
Marcarem
um encontro justamente naquele quarteirão do centro de Boa Graça, onde todos os
prédios permaneciam abandonados havia anos, não era uma boa ideia. Por cima ele
sabia que aquele horário era logo após ela sair da academia.
Estava
cansada, suada, e sentia-se um tanto exposta vestindo camiseta, legging e
tênis. Manteve a bolsa junto ao corpo, e chegou finalmente ao prédio de número
66.
Ao
menos outras três construções daquela rua exibiam placas de “interditado”, mas
não aquele. A escada de entrada imunda dava para um portão de ferro enferrujado
que estava entreaberto, e a vidente suspirou por não sentir nenhuma presença nas
proximidades. Sobre o portão, na beirada da laje, ainda estava o letreiro com o
nome Edifício Jason Teodoro, de uma época em que nomes em inglês ainda não eram
moda. Depois de olhar para os lados e não ver ninguém decidiu entrar.
O
portão rangeu ao ser aberto, e as impressões que ela teve ao tocá-lo não foram
das melhores. Felizmente, nada comparável ao que sentia quando passava com os
rapazes ou Vó Nena diante do Casarão da Rua das Dores. Este, conhecido como a
casa mais mal-assombrada da cidade, era um lugar no qual a jovem vidente torcia
ardentemente para jamais precisar entrar.
Depois
de passar pelo hall de entrada, caminhou por um corredor repleto de lixo e
restos de reboco e tinta das paredes. Apanhou o celular da mochila e acendeu a
lanterna, pois conforme se distanciava do portão a escuridão aumentava. Pelas
portas entreabertas restos de móveis, uma e outra peça de roupa esquecida havia
décadas, e as coisas típicas que se podia encontrar em um prédio abandonado.
Tatiana
decidiu subir as escadas depois de mandar uma mensagem de texto, avisando
Daniel que havia chegado.
O
hall de escadas tinha amplas janelas que contribuíam para um pouco de
iluminação, mas a sujeira que cobria os vidros garantia que a penumbra de final
de tarde continuasse. Tatiana voltou a guardar o celular na mochila e sentiu os
dedos roçarem em um velho livro.
Aquele
tratado de bruxaria fora presente de Daniel, que disse ter lembrado dela ao
passar no Sebo do Hugo. Tati disse, ao folheá-lo:
-
Amor, você sabe que não sou bruxa.
-
Vó Nena também não é, mas manda muito bem nos feitiços – ele respondera. – E me
disse que você tem ficado muito boa nessas artes, ajudando também nessa parte!
Ela
riu, eles se beijaram, e Tati abriu o livro mais ou menos no meio, onde estava
o marcador com o logo e as informações da livraria. Hugo, depois da bronca de
Nena no último Natal, e as constantes visitas que a Caçadora vinha semanalmente
fazendo ao sebo, havia feito uma pequena revolução na loja. Até no noticiário
do canal municipal da cidade já havia aparecido, e o marcador personalizado era
um símbolo dessa nova fase.
Tatiana
viu uma bela gravura, que no entanto trazia um quê de bizarro e sobrenatural
que combinava com o livro, representando um sabá em uma antiga floresta. As
bruxas dançavam nuas em torno de uma fogueira, e a ilustração era bastante
detalhada nesse sentido. Deu uma cotovelada no namorado, dizendo:
- Agora já sei por que colocou o marcador bem nesta página, não é?
Tatiana,
cada vez mais imersa na atmosfera mórbida do prédio abandonado, lembrou-se da
cena e riu. Depois voltou à sua mente a lembrança do texto, que mencionava como
as bruxas acreditavam que a energia sexual, do mero ato de se livrar das
roupas, ajudava a aumentar a sensibilidade para as energias místicas.
A
vidente pensou nisso, ao mesmo tempo em que procurava evitar os detritos e o
lixo do prédio. Parou um momento diante de uma sala sem porta, observando na
penumbra do cômodo uma velha cadeira de madeira. Fechou os olhos, e em sua
concentração não captou nada dentro do prédio. Ali haviam funcionado vários
escritórios e pequenas empresas ao longo dos anos, e a moça não conseguiu
sentir nada tão tenebroso, nem qualquer presença humana.
Abriu
os olhos, sorriu, e em pensamento desejou dar um beliscão no namorado.
Certamente Daniel tivera alguns bons motivos e várias segundas intenções
naquela semana. Primeiro a presenteando com o livro, destacando o capítulo
sobre as bruxas e a energia sexual, e depois marcando aquele encontro bem ali.
Tati sabia que aquele prédio por vezes era usado por casais para encontros,
inclusive aqueles mais íntimos. Uma boate e dois bares haviam aberto
recentemente nas proximidades, e em breve aquele trecho da rua estaria lotado
de gente.
Mas
por enquanto, naquele horário, não haveria maiores riscos.
A
vidente decidiu experimentar. Sua sensibilidade já havia captado um e outro
ponto onde, recentemente, pessoas haviam sentido prazer. Apesar de perturbada
pela mistura de morbidez, o fundo de energias místicas pesadas que emanavam de
outros locais nas proximidades, e o próprio gosto pela aventura, Tati sentiu
também a própria excitação.
Olhou
para as duas pontas do corredor escuro, colocou a mochila sobre a cadeira, e
por fim tirou a camiseta. Dobrou-a e a guardou na mochila, e começou a tirar a
calça. Felizmente tinha o hábito de usar biquíni debaixo da roupa quando ia
para a academia, mas mesmo assim sentia-se praticamente nua.
Depois
de fechar a mochila deixou a cadeira ao lado da porta, na escuridão, de forma
que não seria vista caso passasse alguém. Ajeitou o biquíni, verificou os
cadarços dos tênis que manteve nos pés, já que não queria se arriscar a pisar
em algo e se machucar, marcou bem em qual sala do segundo andar deixara suas
coisas e saiu caminhando.
A
moça verificou novamente que as peças do biquíni estavam no devido lugar, e
antes que se desse conta passou as mãos pelo corpo suado. Seu físico vinha
melhorando nos últimos meses, o corpo, braços e pernas mais torneados, e Daniel
não cansava de elogiá-la.
Tati
sentiu prazer, percebendo ao mesmo tempo, aos poucos, sua percepção ser
ampliada. Contornou a curva do corredor, e as energias do lugar fluíram para
sua mente, e ela conseguia ver aquele corredor que percorria como havia sido
anos antes, com circulação de pessoas que iam de lá para cá, procurando uma
sala específica, resolvendo problemas e questões profissionais ou simplesmente fazendo
seu trabalho.
A
vidente parou no exato ponto em que um casal estivera no máximo dias antes.
Esforçou-se para evitar tocar o ponto na parede onde haviam se apoiado, mas não
conseguiu. Colocou a mão nos tijolos aparentes, e quase podia vê-los em pleno
ato.
Seu
corpo foi percorrido por um profundo arrepio. Medo, repulsa, excitação e desejo
se misturavam em sua mente, e a moça sentiu o coração bater mais forte no peito
e a respiração ficar ofegante.
Tirou
a mão depressa.
Outra
coisa, que parecia distante mas subitamente a invadiu arrepiando sua pele,
surgiu. Medo.
Um
terror profundo, eco de coisas horríveis que haviam acontecido nas
proximidades, ali e em alguns dos demais prédios. E também mais distante, no
portal das trevas que era o Casarão da Rua das Dores.
Tati
sentiu-se exposta e desprotegida. Aquela havia sido uma péssima ideia,
amaldiçoou o livro e o namorado, e correu para a sala onde havia deixado a
mochila.
Teve
a pior das surpresas. Suas coisas não estavam lá.
Tatiana
segurou a cadeira, olhando-a como se de alguma forma a mochila estivesse
escondida ali. Nada. Vasculhou a sala o melhor que a penumbra permitia, mas
havia somente lixo.
A
moça, somente de biquíni e tênis, foi tomada por desespero e medo. Não podia
sair daquele jeito. Teria que esperar Daniel chegar e arrumar roupas antes que
pudesse ir para casa. O pensamento de estar quase nua era incômodo, jamais
sentira tanta vergonha na vida, mas ela se surpreendeu ao ainda experimentar a
mesma excitação de antes.
Aguçou
sua percepção, e reparou em algo indefinível bem na direção da escada por onde
havia vindo. Com medo, decidiu continuar em frente. Sabia existir uma saída no
térreo pelos fundos, e torcia para que houvesse outra escada também.
Foi
andando com todo o cuidado, superando outra esquina do corredor. Prendeu a
respiração por um momento, e rapidamente levou as mãos à boca para abafar um
grito de puro terror.
Uma
caveira jazia no chão logo à frente.
Tatiana
escondeu o rosto com as mãos, sentiu lágrimas encherem seus olhos e o desespero
inundar sua alma. Um suor frio percorreu seu corpo, e ela lutou por um tempo
que pareceram horas para recuperar o controle.
Descobriu
o rosto, e olhou para a caveira no chão. Enegrecida pelos anos em que estava
largada ali, e a impressão de sua vidência lhe dizia que havia sido furtada de
uma das faculdades de medicina das cidades vizinhas. Tatiana percebeu a ideia
de algum trote ou brincadeira de mau gosto envolvendo a caveira, e afinal se
tranquilizou.
O
insólito e o medo da situação, sentindo-se exposta tanto física quanto
psiquicamente, contribuíra para se desesperar. Conseguiu finalmente rir da
situação, afinal já havia visto coisas incomparavelmente piores, mais
aterrorizantes e tétricas do que uma simples caveira no corredor de um prédio
abandonado. Por precaução contornou o objeto desagradável e continuou em frente
com cuidado redobrado.
Lá
fora já escurecia, a moça continuava pensando como sairia daquela situação
seminua como estava. E ainda havia sua vidência, revelando-lhe impressões do
passado daquele prédio que a invadiam sem controle. Tatiana precisava se
esforçar para não perder o contato com a realidade, afinal não queria estar
devaneando nas lembranças dos outros, conforme por vezes dizia que se sentia
durante aqueles fenômenos, e ser surpreendida daquele jeito.
Seguiu
pelo corredor à direita, em meio à penumbra, e esforçando-se para manter o
controle. Impressões sobre o passado, pessoas trabalhando, enfrentando a rotina,
discutindo com colegas ou chefes, e até mesmo lidando com affairs continuavam a
invadi-la. Tatiana parou diante de uma porta entreaberta, e sua vidência
revelou que ali já funcionara um escritório de alguma empresa de comércio. Mas
o que a incomodou foram as lembranças, impregnadas na energia do lugar, de um
caso envolvendo a secretária e o gerente.
Eles
ficavam até tarde da noite em “hora extra”.
A
vidente de novo sentiu sua excitação aumentar. Um arrepio percorreu seu corpo,
seus braços a envolveram como se abraçasse a si mesma, e ela por fim soltou um
profundo suspiro.
De
novo pensou que tinha vontade de esganar Daniel. Sentindo-se nua de corpo e
alma deu mais alguns passos até a curva à esquerda do corredor.
Tampou
a boca com a mão e depressa se escondeu, apertando as costas junto à parede.
Depois
de respirar fundo tentando não fazer barulho, olhou de novo para ter certeza de
que estavam mesmo ali, e não eram impressões do passado que sua vidência
revelava.
Sim,
estavam. Um jovem casal.
Ela
de frente para a parede, apoiando nela as mãos. O rapaz, atrás dela, a abraçava
forte, beijava sua nuca e mordiscava suas orelhas. Com as mãos erguia a saia
jeans que a menina vestia, a apalpando por baixo.
Tatiana
sentiu seu desejo aumentar. Suava, teve que controlar sua mão esquerda, que
queria descer entre suas pernas, enquanto continuava a tapar a boca com a
direita.
Seu
estado de excitação era tal que as visões e impressões a invadiam sem controle.
E ela sentia o que os namorados a poucos metros dela sentiam. Ficou
aterrorizada com a possibilidade de perder o pouco controle que ainda tinha,
fazer barulho e ser flagrada.
Tentou
se concentrar, e conseguiu bloquear parte das impressões. Recuperada um pouco,
deu mais uma olhada no casal, vendo que o rapaz , depois de subir a saia da
moça, começava a baixar suas calças. Escondeu-se de novo, e decidiu entrar em
uma das salas para esperar que fossem embora.
Tati
se virou, e seu pé inadvertidamente chutou uma lata enferrujada, de uma bebida
ou produto irreconhecível, que ela não havia visto no chão. Ela então ouviu:
-
Que merda foi essa? – o rapaz perguntou.
-
Meu Deus, o que foi isso? – a moça acrescentou, já em pânico.
A
vidente ainda ouviu o barulho deles arrumando as roupas, enquanto tentava
correr sem fazer ruído. Enfiou-se na primeira sala que viu aberta.
Que
vinha a ser a do escritório dos dois amantes, a secretária e o gerente.
Na
quase obscuridade do cômodo ela tateou. À esquerda da porta havia um armário, e
ao lado dele um espaço vazio. Encostou as costas na parede e ficou ali quieta, cobrindo
a boca e o nariz com as mãos para não fazer ruído.
Ouviu
as vozes deles se aproximando.
-
Eu ouvi alguma coisa – disse o rapaz. Tentava parecer valente, mas seu medo era
nítido.
-
Também ouvi. Será fantasma? Dizem que toda essa vizinhança é assombrada! – a
voz da menina evidenciava como estava trêmula e apavorada.
Eles
pararam bem diante da porta do escritório.
Tatiana
esforçou-se para respirar o mais levemente possível, tentando não fazer ruído.
Ao mesmo tempo as energias do lugar, as imagens que via dos encontros da
secretária com o gerente a faziam tremer de vergonha, medo e desejo.
Uma
luz varreu a parede oposta. O rapaz vasculhava o cômodo, desde a porta, com a
lâmpada do celular.
-
Pelo amor de Deus, vamos embora! – insistia a moça.
Mais
uma varrida de luz, e depois esta se apagou. Tatiana, em seu transe, mal
conseguindo se conter entre a excitação e a vergonha de estar somente de biquíni
e tênis, sentia o desespero tomando conta de si. O pavor de se trair a qualquer
instante a invadiu.
Finalmente,
conseguiu ouvir os passos do casal se afastando. Correram pelos corredores, e então
desceram a escada para o térreo. Depois, nada.
Ela
ainda esperou mais alguns instantes até tudo ficar silencioso para finalmente
tirar as mãos do rosto.
Soltou
um profundo suspiro, e não mais conseguiu controlar as energias, que percorreram
seu corpo livremente. Desejo, excitação, medo, terror, vergonha, tudo se
misturou em seu interior, e ela por fim perdeu a noção de realidade.
A
próxima coisa que se deu conta foi de estar de volta ao corredor, sentada no
chão com as costas apoiadas na parede próxima à porta. Uma das mãos entre as
pernas, enquanto o indicador da outra estava em sua boca.
O
desejo enfim dominou Tatiana, e ela suspirou longa e ruidosamente. Sentiu o
corpo amolecer.
Ao
se dar novamente por si pensou em Daniel. Se ele chegasse agora, primeiro ela
bateria nele.
Depois
o agarraria, beijaria e violentaria.
Trêmula
e suada, a vidente olhou para todos os lados. Não se lembrava de como havia chegado
ao corredor. Suspirou aliviada por não haver mais ninguém à vista. Aqueles
garotos já deveriam estar bem longe.
A
noite se iniciava lá fora, estava escuro e dentro do prédio mais ainda.
Tati
se levantou enquanto pensava de novo em sua situação. Estava somente de biquíni
e tênis, sozinha em um prédio abandonado, suas roupas e seu celular estavam na
mochila que havia sumido, e nem sinal de que Daniel chegaria em breve.
Como
sairia daquela roubada?
Nisso,
de novo sobressaltou-se e ficou ofegante.
A
vidência revelou que alguém a observara enquanto estava ali, desfrutando e se
aliviando de seu desejo intenso. Tati sentiu medo e vergonha, mas novamente
tudo era temperado por um tesão que não conseguia entender.
E
ela também ouviu um ruído na direção do corredor onde o jovem casal namorava.
O
pavor foi mais forte. Correu de volta ao antigo escritório para se esconder no
mesmo lugar. Conseguiu em meio à penumbra ver uma vassoura velha jogada no
chão, e a ideia que teve lhe deu coragem.
Segurou
o cabo do utensílio ao mesmo tempo em que punha o pé sobre a parte de baixo,
que exibia poucas cerdas restantes. Forçando com as duas mãos partiu o cabo
próximo à base, e ficou satisfeita ao constatar que a ponta resultante era
razoavelmente afiada.
Escondeu-se
novamente atrás do armário, segurando firme o cabo da vassoura. Na confusão de
sentimentos, impressões e emoções em que estava, não conseguia dizer se a
presença que sentia à distância era humana ou sobrenatural. O cabo de vassoura
bastaria caso fosse um vampiro. Contra um atacante humano, por sua vez, Tatiana
sabia bem quais pontos atacar com aquela arma, a fim de causar danos não
permanentes.
Ou
mesmo permanentes, conforme vinha aprendendo com Vó Nena e os rapazes. Ouviu passos distantes, e sua
respiração ficou ofegante. Sentiu o corpo suado, e as impressões daquela sala
ameaçavam turvar sua consciência novamente. A jovem vidente forçou ao máximo
sua concentração no agora, apertou as mãos ao redor do cabo da vassoura e
procurou respirar o mais levemente possível.
Os
passos se aproximaram, e ela colocou a estaca improvisada em posição de ataque.
Porém, subitamente, o som parou, para ser ouvido em seguida desta vez se
afastando.
Tati
saiu de seu esconderijo e olhou com cuidado pela porta do antigo escritório.
Bem na direção de onde vieram os jovens conseguiu divisar uma sombra virando a
curva do corredor.
E
havia mais. A última coisa que desapareceu no outro corredor era sua mochila,
nas costas do indivíduo que vira de relance.
A
vidente desta vez sentiu raiva, e teve ganas de gritar com ele. Mas voltou a
entrar no escritório e, encostando as costas ao lado da porta, fechou os olhos
e respirou fundo algumas vezes.
De
novo se lembrou que estava quase nua, de biquíni e tênis, constrangida,
envergonhada, exposta e com medo. Mas pensou que poderia usar aquilo a seu
favor. Ao vê-la assim, aquele estranho poderia hesitar pelo tempo necessário
para Tati dominar a situação.
Mas
teria que segui-lo e encontrar uma forma de emboscá-lo. Para isso, a primeira
coisa que fez foi sair devagar do velho escritório e andar com todo o cuidado
na direção em que ele sumira. Chegou à curva do corredor e olhou rapidamente.
Não
viu ninguém. Segurando com firmeza a longa estaca improvisada, seguiu adiante
no escuro. Já era noite lá fora, e a pouca iluminação da rua não era suficiente
para ver muita coisa dentro do prédio.
Tatiana
chegou a outro corredor, e pensou em qual direção seguir. Fechou os olhos por
alguns instantes tentando sentir algo, mas então se assustou com um ruído
distante.
Vinha
do hall de escadas da parte de trás do prédio, que ficava à direita de onde
estava. Com cuidado, procurando não chutar novamente nada que estivesse no
chão, ela prosseguiu.
Estava
excitada e atenta àquela caçada, mas o sentimento de estar quase sem roupa, a
vergonha e o medo a tomaram novamente. Desta vez, entretanto, Tati forçou a si
mesma para continuar em frente, e chegou à escadaria. Olhou para cima, mas em
meio à penumbra não viu nada.
Porém,
desta vez, sua vidência lhe forneceu a direção aproximada de para onde o
estranho havia seguido. E, enquanto subia devagar as escadas com a estaca em
riste, começou a divisar um plano.
Chegou
ao terceiro andar e olhou para os lados. Nada. Fechou os olhos novamente,
respirando pausadamente e buscando ampliar seus sentidos. E viu que o estranho
havia rumado para a esquerda, talvez para contornar o andar pelo corredor
principal.
Tatiana
abriu os olhos e, pela primeira vez em muito tempo, sorriu. Considerou que
tinha uma boa chance. Seguiu pela direita, o mais depressa possível, sempre
atenta para não pisar em nada e fazer barulho, o que arruinaria seu plano.
Subitamente,
um novo terror a assaltou. Sua vidência revelou um corredor diferente daquele
em que estava, ou pensava estar. Ainda mais sombrio, decadente, e que parecia
se estender ao infinito.
A
moça sentiu então algo ainda pior. Presenças tenebrosas e inomináveis pareciam
espreitar de todos os cantos. Ela quase fraquejou ao constatar a evidente
malignidade daquela visão.
Levou
uma das mãos à boca para não gritar de horror, e nesse momento a lembrança de
sua avó, Esmeralda, de quem havia herdado a vidência, surgiu em sua mente. O
efeito calmante foi mais que bem-vindo, e Tati se recordou das longas conversas
que tinha com a amada vozinha. E ela se lembrou, afinal, de Esmeralda lhe dizer
que havia vislumbrado locais ocultos, onde o mal sempre está à espreita.
A
jovem vidente recordou como a avó havia dito que nada dissera a respeito para
uma grande amiga dela, combatente de todas as forças das trevas. Mas Esmeralda
ainda deixou claro que sua neta um dia também conheceria aquela amiga, e juntas
derrotariam o mal.
As
lembranças contribuíram para que Tatiana relaxasse. Mas a visão sombria
continuava ali, e ela finalmente cambaleou e apoiou uma das mãos na parede,
lutando com todas as forças para não cair. Nesse momento a visão se dissipou, e
a moça se viu novamente no corredor do Edifício Jason Teodoro. Suspirou fundo
por não haver deixado a estaca cair, e quase se sentia aliviada por estar
naquele ambiente já familiar, menos sombrio e maléfico.
Tatiana
caminhou pelos corredores escuros e imundos. A brisa da noite entrava pelas
janelas quebradas e arrepiava sua pele, e ela se sentiu sendo novamente tomada
pelo medo, vergonha, e por aquela inacreditável excitação. Sua vidência lhe
revelou alguns ataques de criaturas da noite e Encantados naquele andar, mas a
moça se esforçou para manter sua concentração no presente.
Parou
por um momento, apoiou as costas na parede do corredor e se concentrou.
Encostou a estaca na testa, e pensou o quanto deveria estar imunda por causa
daquela experiência. Sentiu as costas tomadas por poeira que havia grudado em
sua pele devido ao suor, mas deixou isso de lado. Estendeu sua vidência, e viu
que o estranho estava próximo, andando devagar no corredor que estava bem
adiante, à esquerda da próxima curva.
Tati
normalmente exploraria mais fundo, tentando descobrir a identidade do inimigo.
Mas não havia tempo, ela estava cansada e sabia que precisava surpreendê-lo
para ter uma chance. Abriu os olhos, deu mais alguns passos e encontrou à direita
uma porta aberta. Entrou rapidamente e viu que também era um antigo escritório,
mas felizmente nenhum sinal de antigos casos extraconjugais a atingiu dessa
vez.
Depois
olhou adiante, e percebeu que, de um foco de luz na rua, vinha uma luminosidade
que tornava aquele pedaço do corredor bem mais claro. E isso deu a ela uma
ideia para distrair o estranho, o que aumentaria suas chances. Lembrou-se do
caso da Caneta Azul, e de como não seria a primeira vez em que usaria sua
sensualidade para obter o que queria.
Mas
era algo que a deixaria ainda mais exposta do que já estava. O medo, a vergonha
e o constrangimento voltaram a assaltá-la. Mas, na situação em que estava, não
havia alternativas.
Sentindo
que o estranho se aproximava ela rapidamente colocou a mão direita atrás das
costas e desfez o nó da parte de cima do biquíni. Tirou a peça rapidamente e a
deixou jogada bem no centro da parte iluminada.
Agora se sentia ainda mais nua, mas não havia tempo. Deu dois ou três passos e entrou novamente no escritório escuro, apertando as mãos na estaca enquanto aguardava.
Passos
se aproximavam lentamente, e Tatiana sentia que estava esperando por uma
eternidade. Seu coração martelava em seu peito, seus seios nus a deixavam ainda
mais excitada, e um arrepio percorreu seu corpo, misturando o tesão com o frio
que sentia devido ao vento que entrava pelas janelas.
O
som dos passos estava cada vez mais próximo. Com um olhar rápido Tati viu uma
sombra no chão do corredor diante da porta, vindo pela esquerda, e ela se
esforçou para controlar sua respiração ofegante.
Alguns
segundos depois um cara de calça jeans e camisa, com sua mochila nas costas,
passou pela porta. Envolta em escuridão, Tatiana se concentrou na figura.
Aconteceu
como ela havia imaginado. O estranho deu mais alguns passos e parou bem diante
da área iluminada. Tati se aproximou da porta sem ruído, e viu que ele
observava a parte superior de seu biquíni jogada no chão.
A
moça se aproximou por trás dele, enfiou a estaca entre suas pernas e, com um
golpe rápido, o derrubou. Depois girou a arma, acertando-o na lateral do corpo
bem sobre o rim, e afinal pôs o pé em seu peito, mantendo a ponta da estaca a
centímetros de seu rosto.
Os
olhos dele se arregalaram para ela.
E
os de Tati também pareciam haver dobrado de tamanho.
Ela
jogou para o lado a estaca, cobriu os seios com as mãos, e correu para apanhar
a parte de cima do biquíni. Enquanto voltava a vestir a peça gritou:
-
Seu filho da puta!
Depois
de dar o nó no biquíni atrás das costas, as emoções aflorando em sua mente,
tomada por vergonha, medo, raiva, tesão e desejo, ela apanhou a mochila que
havia caído ao chão e a abraçou diante de seu corpo enquanto se encostava na
parede.
Daniel,
depois de mais alguns instantes, respirou profundamente e soltou um:
-
Ai.
-
Te odeio! Eu gosto muito da minha sogra, então não posso te chamar de filho da
puta. Mas você foi um grandessíssimo de um filho da puta!
Massageando
o lugar onde Tatiana o havia acertado, o rapaz se levantou reclamando.
-
Caramba, Tati, precisava bater com tanta força?
-
E como eu ia saber que você não era um bandido, um tarado ou um vampiro?
-
Você é vidente...
-
Cala a boca!
Tentando
se recompor, Daniel se aproximou e estendeu a mão. A namorada se afastou pro
lado e disse:
-
Nem vem!
-
Tati, eu...
-
Você tinha que me dar esse livro aqui, né? – disse ela apanhando o volume na
mochila. Depois de quase esfregá-lo na cara dele o enfiou de volta e
prosseguiu: - Meu Deus, nem acredito que fiquei todo esse tempo aqui quase nua,
e você se divertindo às minhas custas!
Ele
ia dizer alguma coisa, mas ela continuou:
-
Daí você disse para virmos aqui para treinar, e eu lembrei do raio da cena do
sabá, e quis experimentar...
-
O que me lembra daquela volta de Brasília, quando paramos na estrada de
madrugada para esfriar a bobina do Fuscão. Você tinha comprado esse biquíni pra
essa viagem, e resolveu colocá-lo de novo naquela noite na estrada pra brincar
um pouco...
-
É, eu estava inspirada e com tesão, foi gostoso... não muda de assunto, porra!
Tatiana,
tomada por emoções, quase esquecera que ainda estava praticamente sem roupa.
Largou a mochila no chão e deu alguns passos, os braços cruzados sobre os
seios.
-
Sim, toda essa excitação abriu mesmo minha percepção. Não é a à toa que muitas
cerimônias e feitiços envolvem sexo.
Ela
sentiu novamente o desejo aumentar. Tentou ignorar, mas estava cada vez mais
difícil. Por cima, de costas para Daniel, nem precisava da vidência para saber
que ele a estava devorando com os olhos.
-
E depois tudo piorou quando minha mochila sumiu.
-
Achei que você tinha largado lá, e a apanhei para depois devolver a você.
Pensei que estava explorando o prédio.
-
E estava.
-
Sim. Quase pelada. Não vou dizer que não gostei, muito pelo contrário...
Tatiana
se virou e teve ímpetos de avançar contra ele, mas se controlou.
-
Tive que me esconder quando aquele casalzinho apareceu – comentou Daniel. – Aí
percebi que você estava do outro lado, e quase fiz barulho pra chamar a atenção
deles.
Tatiana,
ainda brava, ouvia o relato do namorado. Ele prosseguiu:
-
Daí eles logo foram embora, e me aproximei. Vi você saindo da sala cambaleando
e quase fui te acudir, mas então você sentou no chão, e...
-
E o quê? – Tati perguntou, já adivinhando o que ele diria.
Daniel
ficou ruborizado. Tatiana adorou vê-lo constrangido. Sua cena no corredor, como
a vidência havia revelado, tivera mesmo plateia.
-
E... eu te vi. Tati... meu amor, me deixou sem fôlego! Nunca te vi gemer e suspirar
daquele jeito!
A
moça, ainda somente de biquíni e tênis, permanecia de braços cruzados e com
expressão séria no rosto, olhando para o lado. Depois se virou para ele,
olhando com cara de poucos amigos.
-
E depois por que fugiu de mim e me deixou andando seminua pelo prédio, pensando
no pior?
A
cara de tesão de Daniel, mais a conferida que ele lhe deu de alto a baixo,
foram resposta mais que suficiente. Por fim a seriedade deixou o rosto de Tati,
que abriu um grande e adorável sorriso.
Um
sorriso bastante sacana, que ela complementou mordendo o lábio inferior.
-
Vem cá!
Daniel,
apanhado de surpresa, demorou alguns instantes para entender. Depois de uma
última olhada cheia de desejo para a namorada linda, cumpriu a ordem.
Tatiana
o agarrou, enlaçando-o com a perna esquerda, ao mesmo tempo que o beijava com a
maior volúpia e desejo que já sentira na vida. Daniel sentiu a língua dela
explorando cada canto de sua boca, ao mesmo tempo que suas mãos passeavam e o apertavam
em todos os lugares. Ele, naturalmente, retribuiu apalpando e apertando cada canto
do corpo suado e quente de Tati.
Os dois ficaram ali por um bom tempo.
Espero que tenham gostado desta
história! Como mencionado no conto, Tatiana já havia utilizado sua sensualidade
na história da Caneta Azul (que até me rendeu um xingamento em um grupo do
Facebook, que foi apagado pelos administradores) mas me surpreendi até onde ela
se deixou levar nesta trama.
A ideia veio desta cena antológica do
filme Todo Mundo em Pânico (Scary Movie, 2000) com a bela Carmen Electra:
Naturalmente cenas sensuais são tradição em histórias de terror, como podem ver conferindo as mais icônicas clicandoaqui.
E, por sinal, o biquini vermelho de Tatiana terminou por ser uma referência à icônica série Os Gatões (The Dukes of Hazzard, 1979 – 1985), especificamente a esta cena com a maravilhosa Daisy Duke (Catherine Bach):
As imagens deste primeiro conto ilustrado no Escritor com R foram produzidas com o aplicativo Dream by Wombo, uma inteligência artificial (AI) para desenhos, utilizando tanto a versão para celular quanto o site.
Sim, foram centenas de tentativas e mais de 200 imagens até escolher as mais adequadas. Até por isso fica muito claro que esse e outros aplicativos que utilizam AI de forma alguma substituem artistas humanos.
Tenho feito posts em minha conta no
Instagram, @renatoa.azevedo , utilizando imagens produzidas pelo Dream. Até
mesmo as capas dos recentes e-books, A Lista: Diversidades e Os Gatos deVecruz, foram produzidas assim. Com adição de vários elementos a posterior,
como títulos, claro.
De novo, nenhuma AI irá substituir
artistas humanos. Bem, isso não é muito certo com relação aos roteiristas de
Hollywood em greve, visto os fiascos colossais de certas produções lacradoras
dos últimos tempos...
As AIs são ferramentas, somente isso, e
foram criadas para auxiliar e não substituir. Claro que você não deve responder
se alguma delas perguntar a respeito de Sarah Connor!
Então, “guerrinhas” e outras atitudes
patéticas movidas por quem deveria ser profissional e se preocupar em contar e
publicar boas histórias não fazem o menor sentido.
Abaixo, algumas imagens extras produzidas
utilizando variados estilos no Dream.
E, se chegou até aqui, muito obrigado! Sua recompensa está abaixo:
Cena pós-créditos
A
noite estava fria quando Daniel saiu pelo portão de trás do prédio. Como no
restante daqueles poucos quarteirões os imóveis estavam abandonados, e somente
em um e outro fracas luzes bruxuleavam.
Ele
abriu a porta do Dodge Charger branco e entrou, a fim de aguardar Tatiana que
tinha parado para se vestir. Porém, seu espanto foi enorme quando viu a
namorada sair pelo portão, dar passos rápidos pela calçada, abrir a porta e
entrar no carro.
Ainda
vestia somente o biquíni vermelho e os tênis com que a encontrara. Outro carro
passou pela rua enquanto isso, mas Tati nem ligou.
-
Mas você não ia se vestir? – perguntou.
-
E você não ia me levar para casa? – ela devolveu com um sorriso sacana.
O
jovem Caçador sorriu depois de mais uma conferida no belo físico da amada,
ligou o motor V-8 do carro e saiu.
Tatiana
abriu a mochila, tirou a camiseta e a vestiu. Depois, com a expressão mais
tranquila deste mundo, ficou observando a paisagem que passava.
Daniel,
claro, estava adorando o espetáculo de vê-la assim. Deslizou a mão e a pousou
na coxa da namorada, que se virou para ele e sorriu.
- Você quer dizer alguma coisa, querido?
Tatiana
perguntou isso com o ar mais inocente do mundo, mas é claro que nem precisava
ser vidente para adivinhar o que passava pela cabeça dele. Dali mais alguns
segundos pararam em um semáforo, ela voltou a sorrir e disse:
-
Ah, amor, que coisa! A alça do meu biquíni desamarrou...
Daniel
voltou a olhar para ela, de novo conferindo-a de alto a baixo. A visão da alça
lateral do biquíni frouxamente solta sobre o banco, deixando à mostra a lateral
do quadril de Tatiana, fez com que em sua expressão várias emoções se
misturassem. Surpresa, vergonha, desejo, tesão...
Depois
de mais alguns segundos em que os dois só se olhavam, alguém buzinou atrás
deles. Tati sorriu de novo e disse:
-
Amor, dirige. Você não está se concentrando muito...
Mais
alguns quarteirões e eles chegaram a uma rua tranquila, perto da casa de
Tatiana. Foi quando um Fusca Azul familiar surgiu logo adiante deles, vindo no
sentido contrário.
Vó
Nena parou o Fusca, sua janela ao lado da de Daniel.
-
Oi, moçada, tudo bem? Como foi a experiência lá no prédio?
Eles
haviam comentado com ela no dia anterior que visitariam o local. Agora era
Daniel que sorria, enquanto Tatiana tentava mostrar um ar de total normalidade.
-
Foi tudo bem, Vó, depois contamos – disse Daniel.
-
Só me poupem dos detalhes das safadezas – riu a anciã. – Sei bem o que vocês,
moleques, aprontam em lugares assim. Ainda bem que não era um dos piores
prédios daquela região filha da puta.
A
Caçadora fez uma pausa e acrescentou:
-
Bom, surgiu um negócio, e bem que a ajuda de vocês me seria útil.
-
Já vou fazer a volta e te seguimos, Vó.
Daniel
disse isso e, enquanto Vó Nena se adiantava no Fusca Azul, ele acelerou e
rodopiou com o Dodjão. Tatiana, ao mesmo tempo, amarrava a alça do biquíni para
depois apanhar a legging na mochila.
-
Ah, não vai ficar assim, amor? – disse ele com ironia, mas com voz carregada de
desejo.
Tatiana
devolveu um olhar irônico para ele enquanto se vestia. Ajeitou a calça, o Dodge
alcançou o Fusca Azul, e ela finalmente sorriu.
-
Você bem que gostaria, não é, querido?
Eles
se olharam, depois sorriram um para o outro e entrelaçaram os dedos das mãos. A
aventura da tarde havia acabado, e a da noite estava somente começando.
Vó Nena e os Caçadores retornarão.
Claro, não esqueçam de conferir os e-books:
VÓ NENA E OS CAÇADORES: O FUSCA AZUL
VÓ NENA E OS CAÇADORES: O LIVRO MALDITO
Até a próxima!
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