sexta-feira, 18 de dezembro de 2020

A Lista: O Natal, o Mundo do Céu Perfeito e o Buraco Negro

  Lucas Oliva estava parado, pés descalços sentindo a areia da praia, e a poucos metros dele chegava a água de ondas plácidas de um oceano que parecia um espelho de tão calmo.

O céu acima era o mais espetacular que já vira. O tenente, em suas missões desde que entrara para o Projeto, havia visto coisas inacreditáveis, que superavam os mais audaciosos arroubos de sua imaginação de leitor voraz.

Mas nenhum autor jamais conseguira descrever o céu que Lucas observou ao erguer o rosto para cima. Absolutamente repleto de estrelas, nuvens interestelares de gás e nebulosas planetárias. Alguns discos escuros de matéria por vezes revelavam um centro muito brilhante, sistemas solares em formação que talvez com sorte, dentro de poucos bilhões de anos, ostentariam planetas de todos os tipos, alguns até com formas de vida.


Ele não estava em seu mundo. Sequer em seu universo.

O Projeto consistia basicamente em uma instalação ultrassecreta na Região Centro-Oeste em seu Brasil de origem, onde nos subterrâneos fora construída a Esfera, um portal capaz de tornar acessíveis inúmeros planetas e Terras paralelas. Cada um dos membros das equipes de Viajantes, nome informal com que se apelidaram, já havia visitado diversas variações de planetas como a Terra, e conhecido um correspondente número de outros Brasis, alguns bem diferentes, outros parecidos com o deles.

Mas, de vez em quando, o portal se abria para universos e planetas que se revelavam completas surpresas. Como aquele em que estava, que fora chamado informalmente de O Mundo do Céu Perfeito. De dia o firmamento era de um azul ainda mais intenso que o de sua Terra, com formações de nuvens brancas de todos os tipos.

Á noite faixas luminosas, similares às auroras das regiões polares da Terra, davam ao panorama um aspecto de permanente crepúsculo. O fenômeno era alimentado pelas fortíssimas emissões eletromagnéticas e de radiação provenientes do centro daquele sistema.

As datações indicavam que o planeta tinha pouco mais de 3 bilhões de anos, e surpreendentemente haviam encontrado alguns sinais de construções por obra de seres inteligentes. Pelo pouco descoberto, estes poderiam ser relativamente semelhantes a humanos e visitantes vindos de outra procedência. Mas não puderam encontrar nenhuma pista sobre qual fora o destino final deles.

- Pensando naquele filme do planeta oceânico na órbita do buraco negro?

Lucas se virou e ergueu a mão para bater continência, mas a major Sandra Botelho, que liderava a missão, fez um gesto para que dispensasse a saudação. O tenente olhou ao longe e viu que ela também havia tirado as botas e as deixado ao lado das suas. Depois Sandra dobrou as barras da calça e pôs os pés na água tépida do oceano.

Fazia calor, ao menos 35 graus, e a umidade da atmosfera era elevada graças ao oceano, que ocupava a maior parte da superfície daquele mundo. Eles estavam em uma península no extremo da maior massa de terra remanescente, existindo ainda um continente menor e inúmeras ilhas esparsas.

- Não senhora – comentou Lucas respondendo à pergunta enquanto também mergulhava os pés na água. – É verdade que o que aconteceu àqueles personagens sempre me volta ao pensamento, mas estava lembrando da imagem chamada de Galaxy Rise.

- O Nascer da Galáxia? – perguntou Sandra. – É de qual filme?

- Do livro Cosmos, de Carl Sagan. É o livro mais antigo que ainda tenho, e corri para comprar a série quando saiu o DVD.

Sandra riu, deu mais alguns passos na água e depois retornou para a areia clara. Comentou:

- Sempre preferi estas missões científicas a todas as outras. Até mesmo aquelas dedicadas a encontrar membros da Lista em outras realidades, na esperança de descobrirmos mais a respeito.

- Essas também têm seu valor, major – acrescentou Lucas. – A Lista é mesmo um mistério instigante, e acabamos aprendendo muito sobre outras versões do Brasil nessas viagens. Mas as missões científicas como esta são mesmo fantásticas, e minhas preferidas também!

Sandra sorriu, voltou-se para ele e disse:

- Você curte tanto esses assuntos, Lucas! É um entusiasta da ciência e sempre um dos que mais prestam atenção às explicações do André, por que não busca uma bolsa de estudos e entra em uma universidade?

- Acho que aprendo muito mais dentro do Projeto, major.

Sandra olhou para Lucas e sorriu. Sabia exatamente como ele se sentia.


Os dois ficaram ali, observando o céu tomado de estrelas e formações galácticas. Aquele sistema ocupava uma posição em sua galáxia aproximadamente equivalente a do Sistema Solar em relação a Via Láctea. Porém o céu absolutamente deslumbrante escondia, lá no horizonte, os sinais do recente crepúsculo do objeto celeste ao redor do qual o planeta orbitava. O brilho de jatos de matéria, emitidos a uma velocidade próxima a da luz, ainda iluminava o encontro do céu com o mar, como um lembrete de que aquele panorama paradisíaco não iria durar por muito mais tempo.

Sandra sentou-se em uma pedra para voltar a calçar as botas quando do bolso de seu colete saiu um sinal sonoro. Ela tirou o comunicador, que tinha a aparência de um celular, clicou no botão para a saída holográfica e colocou o aparelho sobre a pedra.

A imagem da bióloga Joana Medeiros surgiu, e ela imediatamente começou a falar:

- Major, terminamos aqui na maior ilha do hemisfério sul. A vista que temos é incrível!

Joana segurava o comunicador na mão, e o colocou um pouco de lado para mostrar o que estava no céu, em posição relativa atrás dela. Aquele era o principal motivo da presença deles naquele mundo.

O enorme buraco negro ao redor do qual o planeta orbitava, a uma distância média de pouco mais de um bilhão de quilômetros e diminuindo, era somente um pouco menor que o Sagittarius A*, o objeto da categoria supermassiva que ocupa o centro da Via Láctea. A galáxia onde estavam tinha pelo menos o dobro do tamanho da nossa, e seu buraco negro central era ainda maior.

Algum fenômeno celestial de proporções extraordinárias havia produzido aquela situação, provavelmente o choque com uma galáxia menor bilhões de anos antes. A existência de um mundo perfeitamente habitável como aquele em órbita do buraco negro, por sua vez, talvez se devesse ao colossal campo de destroços, asteroides, rochas, gás e outros tipos de matéria orbitando o objeto. Essencialmente, os tijolos básicos para a construção de um planeta e de um sistema solar, mas acumulados ao redor de um monumental sorvedouro espacial.

- Já terminamos aqui na ilha – comentou Joana. – Como no restante do planeta, a vida biológica se resume a bactérias e micro-organismos no oceano, e alguns poucos liquens e musgos na superfície. Todos felizmente inofensivos para nós. Mesmo que seja um mundo habitável, com uma camada de ozônio que é o dobro da nossa, ainda assim as condições são severas para formas de vida mais complexas.

- Por isso dependemos exclusivamente do que trouxemos – concluiu Sandra.

- Exatamente, major – respondeu a bióloga. – Bem, nosso trabalho aqui está concluído. Precisa de mais alguma coisa?

- Não, doutora, reúna sua equipe e retorne à base. Vamos aguardar as próximas 9 horas, até o nascer do buraco negro no horizonte, verificar a aparelhagem que deixaremos e aguardar os acontecimentos. Em breve também iremos para casa.

- Combinado, major. Não demorem muito. Lembrem de que a dilatação temporal, graças à gravidade do buraco negro, está aumentando.

Aquela fora a razão pela qual Sandra havia comentado a respeito do tal filme com Lucas. No Mundo do Céu Perfeito, graças à intensa gravidade do buraco negro e a consequente distorção do espaço-tempo contínuo em sua proximidade, o tempo passava mais lentamente do que na Terra. Até o momento, conforme o equipamento que haviam trazido, 18 horas no planeta, que era seu tempo de rotação ou dia, equivaliam a 36 horas na Terra.

Como a órbita do planeta estava decaindo lentamente, essa diferença temporal aumentava a cada momento, mas ainda era manejável. Para tornar tudo ainda mais urgente, eles haviam saído da Terra no dia 19 de dezembro, faltando seis dias para o Natal. Esperavam estar de volta em 22 de dezembro, contando com a variação experimentada no planeta.

O destino final daquele mundo paradisíaco era mergulhar no buraco negro, isso se não colidisse com algumas das rochas, asteroides ou até mesmo estrelas que orbitavam o colossal poço multigravitacional. Através do primeiro satélite que enviaram para a órbita do planeta haviam testemunhado uma estrela laranja pouco menor que o Sol ser “espaguetificada” e desaparecer bem no centro do objeto, o que permitiu a obtenção de inúmeros dados científicos que fizeram a alegria do departamento de Astronomia e Astrofísica do Projeto.


Joana agradeceu e desligou. O restante de sua equipe, outros dois cientistas e três fuzileiros, terminou de arrumar o equipamento e ela acionou no comunicador o comando de retorno.

Uma esfera luminosa surgiu diante deles, porém ao contrário de suas viagens anteriores a imagem piscou e lançou raios luminosos. Parecia um daqueles aparelhos de televisão antigos, nos quais para melhorar a recepção se colocava uma palha de aço na ponta da antena do aparelho.

Quando o portal se estabilizou todos se apressaram para cruzá-lo. Normalmente o viajante não sentia nada, e com um passo estava de volta à plataforma subterrânea na base secreta do Projeto.

Desta vez, Joana sentiu como se atravessasse um longo túnel luminoso.

A sensação durou por um tempo que ela não saberia definir. A moça sentiu ainda outra coisa, algo indefinível que começou a plantar o pavor no fundo de sua mente.

Teve o nítido pressentimento que alguma coisa estava desviando o caminho que percorria entre as inúmeras realidades, afastando-a do destino seguro.

Antes que percebesse sentiu os pés em uma superfície firme, abriu os olhos e se viu no familiar salão de concreto. Olhou ao redor, respirou aliviada pelos companheiros estarem a seu lado, pessoas gesticulavam na sala de controle do portal atrás de uma vidraça na parede adiante, e de uma porta blindada lateral entraram vários militares, cientistas de jaleco branco e o jovem André Lozano.

- Tudo bem com vocês? – perguntou este último com expressão aflita que era muito rara de ver nele.

Todos pareciam muito preocupados, mas Joana respondeu:

- Tudo bem, a passagem pelo portal pareceu mais demorada dessa vez, mas estamos bem.

André a olhou espantado, e enquanto desciam a rampa cada um deles era observado e questionado pelos demais cientistas. O jovem gênio graças ao qual o Projeto devia sua existência se aproximou de Joana e disse:

- Obtivemos seu sinal de retorno faz mais de seis horas. O portal ficou aberto todo esse tempo até atravessarem!

Somente nesse momento Joana observou a fileira de grandes relógios instalada na parede lateral. O que marcava o horário brasileiro apontava que era 06:42 h de 23 de dezembro.

A bióloga virou-se para André boquiaberta, e o cientista disse:

- Temos que alertar Sandra e sua equipe para retornarem agora. A influência do buraco negro aumentou mais do que prevíamos!


A noite no Mundo do Céu Perfeito durou pouco menos de nove horas. Havia muito a fazer, e ninguém quis dormir. Raquel Serendipi, novata no Projeto mas já conquistando seu lugar graças a seus conhecimentos em Astrofísica, ocupou-se com a montagem final do equipamento astronômico que seria deixado ali. Era um telescópio de grande abertura e três outros, incluindo um infravermelho e outro de raios-X que buscavam alvos para o principal, controlados por uma central computadorizada autônoma. Tudo fora instalado em um pequeno monte na base da península na qual estavam.

Raquel acompanhou a trajetória ao longo do sistema de uma estrela amarela, de tamanho equivalente ao Sol, que fora detectada ainda antes da vinda deles. Era do tipo conhecido como de hipervelocidade, sóis que percorrem longas trajetórias ao longo de uma galáxia em altíssimas velocidades. Os cálculos iniciais apontavam que iria contornar a curta distância o buraco negro, mas quando ela desapareceu pelo horizonte a astrofísica refez as contas e ficou em dúvida quanto a isso.

- É provável que acabe mergulhando no buraco negro – comentou.

Ela aproveitou a noite para fazer imagens dos demais planetas em órbita. Dois eram rochosos e pouco interessantes, situados mais próximos ao centro do sistema. Já o mundo situado a mais de dois bilhões de quilômetros do buraco negro era gasoso e classificado como um sub-Netuno, cerca de um quarto menor que o menor gigante gasoso do Sistema Solar. Tinha coloração verde-azulada e faixas multicoloridas que iam do amarelo ao vermelho, indicando compostos orgânicos na atmosfera. Também era o único que possuía satélites, e Raquel descobrira sua sexta lua naquela noite.

Ao se aproximar a alvorada Lucas, Sandra e Raquel desceram para a faixa de areia que era a extensão mais estreita da península, depois que a astrofísica ajustara os telescópios para captar desde o horizonte imagens do buraco negro. O céu escuro foi clareando até o intenso azul que já conheciam, e viram surgir primeiro a estrela amarela que vinham acompanhando. Depois apareceu o disco de matéria que orbitava o objeto central brilhando intensamente.

Raquel olhava alternadamente para o monstro cósmico e para a tela de seu comunicador, e finalmente disse:

- O computador confirmou! A estrela está caindo no buraco negro!


A olho nu conseguiam ver claramente o movimento da estrela, comprovando sua tremenda velocidade. Relativamente à posição do plano da órbita dos planetas aquele sol vinha de cima, e subitamente observaram um fio de matéria sair de sua superfície e mergulhar no centro negro do sorvedouro espacial.

A astrofísica deu pulos no mesmo lugar e correu para o equipamento, impaciente para conferir os dados.

Lucas e Sandra riram e ficaram na faixa de areia contemplando o espetáculo. O tenente olhou para o relógio e disse:

- E então, major, planos para o Natal?

Trocaram olhares sorrindo e Sandra, depois de suspirar e voltar a contemplar o espetáculo cósmico, respondeu:

- Só quero chegar em casa e aproveitar a ceia com minha mãe e Susana.

Sandra criava a filha de sete anos sem o pai da menina, que não aguentara os rigores de ser cônjuge de uma militar. Era difícil para a garota, mas a major fazia o máximo para tornar especial cada vez em que estavam juntas.

- Susana é uma ótima menina, major – comentou Lucas. – E tem muito orgulho da mãe. Todos temos, na verdade.

A militar agradeceu com um olhar emocionado. O tenente completou depois de olhar o relógio:

- Se os cálculos estiverem certos, e espero que estejam, ainda é madrugada de 22 de dezembro em nosso mundo. Depois de voltarmos também vou correr para casa, ansioso por passar uns dias com minha família!

Eles voltaram a ficar em silêncio. O buraco negro já havia subido mais, e podia ser visto em sua totalidade. O que estava diante deles não diferia muito das fotos já obtidas pela Astronomia terrestre e das concepções artísticas. Um enorme espaço negro e esférico era rodeado por um halo distorcido de matéria muito brilhante. O espaço central era absolutamente preto, a coisa mais escura que qualquer um ali jamais vira.

As faixas na atmosfera do planeta brilhavam em várias cores, abrangendo quase todo o espectro, e acentuando o azul da atmosfera. O oceano incrivelmente límpido e calmo refletia aquelas tonalidades, e todos os membros da expedição tinham certeza de jamais esquecer aquele espetáculo multicolorido.

Nesse momento um alarme barulhento soou nos comunicadores de todos. Lucas e Sandra se entreolharam, observaram no alto da elevação Raquel olhar na direção deles, e saíram correndo para lá.


Raquel observou o alarme na tela de um computador portátil semelhante a um laptop, mas dotado de tecnologia derivada da ciência que tornara o Projeto e a Esfera possíveis. A astrofísica abriu espaço e Lucas dedilhou comandos no teclado, mas depois que alguns avisos apareceram na tela disse:

- É um arquivo de vídeo, mas parece ter alguma anomalia. Vou tentar reproduzi-lo...

Depois de mais alguns comandos o programa abriu o arquivo, mas nada distinguiram além de uma imagem borrada e um zumbido no áudio. Raquel comentou:

- É impressão minha, ou parece alguém falando?

Lucas diminuiu a velocidade do vídeo, e a imagem passou a se assemelhar a uma sombra. Mesmo assim a extensão do vídeo não chegava a um segundo, e o zumbido se tornara mais grave.

Sandra pediu que ele prosseguisse naquela tarefa, e mandou que os demais começassem a se preparar para um retorno de emergência.

- Não custa prevenir – comentou ela. – Vamos prosseguir nas tarefas programadas, mas preparados para partir a qualquer momento.

Os três fuzileiros reuniram seus equipamentos e cada um deles correu para fazer uma ronda em sua área determinada. Joana sentou-se diante do equipamento astronômico e fez a programação final do sistema. Também inseriu nas memórias dos três satélites em órbita os comandos e instruções finais. Um permaneceria ao redor do planeta até o final, o segundo se afastaria antes de chegar à região do disco de matéria do buraco negro, e o terceiro regressaria para a base depois da equipe. O Projeto não tinha muita folga orçamentária, e reter intacto qualquer equipamento dispendioso como aquele era uma medida salutar.

- Major, doutora!

Lucas chamou as duas, que vieram prontamente. Ele exibiu na tela do computador o resultado de seus esforços.

Já era possível ver que era André Lozano, porém o vídeo ainda estava acelerado demais. Sandra perguntou:

- Será possível que a distorção temporal tenha feito o vídeo ficar mais rápido que o normal?

- Major, foi gravado em um espaço-tempo diferente do que estamos – teorizou Raquel. – Isso será certamente discutido nas reuniões das equipes científicas. Guardou o arquivo original, Lucas?

- Sim senhora!

O militar continuou trabalhando no vídeo para tornar seu conteúdo inteligível. No céu o centro do sistema continuava seu espetáculo de proporções verdadeiramente cósmicas. A estrela amarela estava visivelmente mais próxima do buraco negro, e o fio de matéria que saía desta e mergulhava através do horizonte de eventos havia se tornado ainda mais espesso.

Evidentemente não escapou a nenhum deles que os eventos que observavam haviam acontecido várias horas antes, devido à distância que os separava daquela mortífera região. Distância essa que, conforme sabiam, diminuía lentamente conforme o Mundo do Céu Perfeito seguia sua órbita ao redor do sorvedouro espacial.

Lucas trabalhou febrilmente, e enfim conseguiu que fosse possível assistir ao vídeo. Todos observaram André dizer:

- Equipe da major Sandra, vocês devem voltar imediatamente! – o cientista dizia enquanto empunhava seu comunicador. Atrás deles passavam pessoas que eles reconheceram como a outra equipe que estava no planeta. André prosseguiu:

- A equipe de Joana demorou seis horas, entre entrar no portal aí no planeta e surgir aqui na base, para retornar. A influência do buraco negro está aumentando de forma não prevista, e ainda existem outras anomalias cuja origem não conseguimos determinar. Aqui em casa já é manhã de 23 de dezembro, e peço a vocês que retornem o quanto antes! Repito, regressem imediatamente!

Ninguém precisou de mais nada para agir. Todos se apressaram a terminar suas tarefas. Lucas asseverou que o arquivo original e o que manipulara haviam sido salvos na memória e guardou o computador na mochila. Os fuzileiros já se encontravam a postos, e o tenente auxiliou Sandra e Joana nos últimos ajustes do equipamento.

Lá no céu a estrela amarela havia diminuído sensivelmente de tamanho, mas alguma matéria dela restara, e possivelmente segundo Raquel algum planeta ainda em órbita. O disco ao redor do buraco negro emitia flashes de luzes intensos e jatos de matéria, e a astrofísica apontou o equipamento, prevendo que emissões fortíssimas de radiação vinham na direção do planeta. Felizmente ainda levariam horas para atingi-lo, quando esperavam não estar mais ali.

Finalmente todos se reuniram na areia da praia. O cenário paradisíaco desta vez encerrava uma ameaça que não compreendiam em sua totalidade, mas a beleza daquele mundo de cores não podia ser ignorada. Antes de acionar o comando de retorno Sandra disse:

- André vai se ver comigo quando chegarmos!

- Major, com todo o respeito, a senhora é a segunda da fila – respondeu Raquel.

A militar conseguiu exibir um sorriso irônico, e por fim acionou no comunicador o comando de retorno. A familiar esfera luminosa surgiu diante deles. Sandra pediu que Lucas passasse primeiro, mas nesse instante o portal pareceu piscar, fazendo estalar partículas na atmosfera ao redor.

O tenente parou, e todos continuaram a observar a esfera luminosa. Mais alguns segundos torturantes se sucederam com o portal assobiando, estalando e piscando, mas finalmente se estabilizou na reconfortante esfera branca que representava o caminho de casa.

Lucas se adiantou e desapareceu na esfera, no que foi seguido por todos. Sandra foi a última a cruzar, depois de uma última olhada no equipamento no alto da elevação e no belo panorama do Mundo do Céu Perfeito.


Lucas olhou ao redor e não viu mais ninguém. O que via lhe fez crer que percorria um longo túnel formado por luzes, algumas vezes brancas, outras multicoloridas. O túnel dava voltas, se curvava e era transparente, e além dele o tenente via estrelas, planetas e galáxias vindo em sua direção e sendo deixados para trás em elevadíssima velocidade. Tudo que havia ouvido e aprendido durante sua participação no Projeto lhe dizia que aquilo não poderia existir, e ficou pensando se as séries e filmes que assistira, ou os livros que lera, estavam influenciando sua mente.

Sandra não conseguia ver os demais, e olhando para frente via somente um círculo multicolorido do qual parecia se aproximar, e de outras vezes se afastar. Deduzira isso pelo tamanho aparente da visão, e decidiu que estava imaginando coisas. Fechou os olhos e reparou que não havia ruídos nem qualquer outra sensação. Esticou os braços para o lado. Nada. Começou a se lamentar por ter decidido atravessar o portal sem aguardar mais um pouco.

Raquel se sentiu percorrendo um longo túnel escuro, onde por vezes reluziam reflexos de luz. Prestando atenção poderia jurar que vira cenas ali, e intuitivamente percebeu que o túnel parecia se curvar. Também de forma instintiva sabia que a única direção certa era direto em frente, e que qualquer desvio representava perigo. Apavorou-se com aquilo e gritou, ou pensou ter gritado. Não ouviu a própria voz e ficou com mais medo ainda. Tentou gritar de novo, mas subitamente tudo ficou escuro.


A próxima sensação que Raquel teve foi pisar em uma superfície sólida. Abriu os olhos e se viu em uma plataforma metálica no meio de um enorme aposento feito de concreto. Diante dela uma grande janela onde os técnicos que controlavam o portal observavam tudo espantados. A moça olhou ao redor e viu os demais companheiros, os emissores do portal que formavam a Esfera, e abraçou Lucas quando sentiu tontura.

Um momento depois uma equipe de cientistas e médicos recebia os seis recém-chegados. Raquel ainda abraçava Lucas, e quando o soltou e olhou para a rampa de descida viu André com cara de espanto olhando para eles. A astrofísica esboçou um sorriso, apoiou a mão no corrimão e começou a descer a rampa, trocando um rápido olhar com o cientista. Ainda sentia vestígios do pavor recente, mas a expressão de André era um alívio para ela, e a fez sorrir mais.


Todos foram rapidamente examinados enquanto André explicava o que havia acontecido. O portal operara por sete horas seguidas, um novo recorde, e finalmente conseguira trazer todos de volta em segurança. O fato de estarem vivos e por unanimidade afirmarem que para eles a viagem durou no máximo poucos minutos poderia se dar, conforme disse, tanto aos efeitos inéditos da proximidade com o buraco negro quanto pela física ainda não totalmente compreendida do portal transdimensional.

Ficaram espantados ao serem informados que já eram 16:58 h de 24 de dezembro. As complexas interações entre os dois contínuos espaço-temporais, e especialmente os efeitos da dilatação temporal nas proximidades do buraco negro, haviam provocado aquilo. O comandante do Projeto ficou satisfeito ao saber do retorno da equipe, e a major Sandra transmitiu sua ordem de que estavam todos dispensados para aproveitar o Natal com as famílias.

- Presente de Natal será sem dúvida o que a equipe de Astronomia e Astrofísica irá receber com os dados que trouxemos, e ainda serão transmitidos do sistema! – comentou Raquel.

A moça brincava, abraçou os companheiros e foi para seu alojamento se trocar. Mas o que sentira ainda a fazia tremer.


Sandra tivera permissão para requisitar um avião da Força Aérea Brasileira para levá-los a tempo para casa. Joana e Lucas aproveitaram a carona, e todos conseguiram chegar em casa a tempo.

Joana fez questão de continuar na base aguardando o retorno dos colegas e ajudando no que podia, mas respirou aliviada ao se sentar à mesa. Olhou ao redor, viu seu irmão com a esposa, seus pais, e sentiu-se feliz. Tentando não pensar na experiência incrível, dedicou-se a saborear a ceia em família.

- Mamãe, você veio!

Susana pulou nos braços de Sandra mal a major abriu a porta de casa. A militar não conteve as lágrimas, e a mãe dela se emocionou ao ver a filha e a neta juntas.

Lucas não aparecia em casa fazia meses, e tocou a campainha um tanto apreensivo. Continuava a pensar na estranha experiência do retorno, e na rápida conversa que teve com André. O cientista fazia pouco caso de suas observações, mas por vezes o tenente o surpreendia com informações e ideias que o faziam pensar. Terminaram por combinar que conversariam mais quando regressasse à base.

- Filho, que bom te ver!

A mãe de Lucas o abraçou forte e o trouxe para dentro. A família toda, incluindo tios, primos e sua avó, estava ali reunida. Ele nem sabia quanto tempo fazia que não via muitas daquelas faces, mas se sentiu feliz por estar ali com eles.


André estava em seu escritório na base. Dedilhava no laptop sobre a mesa, e se levantava para escrever uma equação ou esboçar algum gráfico na comprida lousa que ocupava uma das paredes.

Repetiu esse trajeto várias vezes, alternando com idas à estante abarrotada de livros da parede oposta, quando abria um volume, corria os dedos por uma página, e retornava para a mesa.

Raquel entrou bem no momento em que André, de costas, escrevia algo na lousa. Ao se virar e dar de cara com ela ergueu o tronco e arregalou os olhos de espanto.

A astrofísica estava de camisa branca, calça jeans e tênis. O jovem cientista a olhou por um instante, retornou ao computador e continuou trabalhando.

A moça se aproximou e sentou-se na cadeira do outro lado da mesa. Esperou por algum tempo mas, fora um ou dois momentos em que ergueu os olhos para ela, André permanecia concentrado.

- E aí, o que acha que aconteceu? Por que cada um de nós viu ou sentiu o que descrevemos?

Raquel fez a pergunta lembrando da conversa que tiveram logo após sua chegada. A moça ainda se sentia perturbada pelo que experimentara, tentava usar seus próprios conhecimentos para entender o que houve, e usava de ironia e sarcasmo tanto para provocar André quanto para se animar.

Fez outras perguntas, mas o cientista continuava a ignorá-la. Refez o trajeto ao se levantar, testar uma equação na lousa e consultar um livro. Tornou a dedilhar o teclado do computador, e quando fez menção de se levantar de novo a moça explodiu:

- Vou te bater tanto se fizer isso de novo!

André olhou para ela espantado. Por um momento ambos ficaram sérios, se encarando. Por fim sorriu, deu um comando para salvar o trabalho que fazia e fechou o laptop. Raquel também sorriu, lembrando de outros momentos semelhantes nos últimos meses, desde que entrara para o Projeto.

- As vezes invejo você, Raquel – comentou ele.

Pega de surpresa, a moça perguntou:

- Por quê?

- Claramente, mesmo depois de tão pouco tempo, você está em casa aqui.

- Ué, e você não?

André cruzou os braços apoiando-os sobre a mesa, e por um momento ficou olhando para a mão dela, que brincava com um dos botões da camisa. Ela percebeu e sorriu maliciosamente, ao que ele virou o rosto, ajeitou os óculos, voltou-se de novo para a moça e disse:

- Pela ciência e tecnologia feita aqui, sim. Mas ainda é difícil lidar com as pessoas. Eu vejo como todos já gostam de você, do que faz, enquanto eu...

Raquel apoiou as mãos na mesa, aproximou o rosto dele, e disse:

- Ciúmes do Lucas, é?

- Ha, ha, ha, boa tentativa.

Ela voltou a se recostar na cadeira, ainda sorrindo com malícia. Mas sua voz era séria quando disse:

- Quem sabe, André, se você fosse um pouco menos arrogante, e não tentasse corrigir os outros o tempo todo...

- Você sabe que este Projeto só existe por minha causa, né?

- Claro que sim! Eu e todos aqui. E sim, cada um tem um jeito de manifestar afeição, e todos gostam sim de você, André. De um jeito diferente, claro...

- Ah, é? Por exemplo?

- Sandra e eu conversamos muito no Mundo do Céu Perfeito. Ela te admira muito, e sempre será grata pelo que fez por ela, na época do comandante anterior.

- Ele era um babaca machista que não aceitava o fato dela ser mãe solteira. Ainda por cima era um ignorante, e estava no cargo por amizades políticas.

- E vocês dois o derrubaram, e agora o Projeto está em mãos muito melhores. Muitos te admiram pelo que fez, e também por isso são tolerantes com seu jeito e suas manias.

André recostou-se na cadeira, parecendo ao mesmo tempo confuso e agradecido. Tirou os óculos e esfregou os olhos, e Raquel ficou em dúvida se estava emocionado. Completou:

- Então não fique com inveja de mim, e trate de ser um pouco mais tolerante e aberto com todos, certo?

- Logo, logo, você vai ser a nova psicóloga da base desse jeito.

Raquel se levantou com expressão de poucos amigos. André se assustou, baixou os olhos, tornou a olhar para ela e disse:

- Quero dizer, sim senhora!

Ele exibiu um sorriso irônico, ao que Raquel retribuiu e tornou a se sentar. Ela voltou a mexer no botão da camisa por um instante, novamente o flagrando olhando para seu ato. Riu e perguntou:

- Não foi pra casa para o Natal?

- Nunca gostei muito das festas de final de ano. E sempre tive um relacionamento difícil com minha família.

O silêncio durou alguns instantes antes de André parecer se dar conta de algo e dizer:

- E você?

Raquel sorriu, pensou um pouco e finalmente disse:

- Meus pais são separados. Mamãe sempre apoiou minha carreira acadêmica, já meu pai é tradicionalista demais. Brigamos demais quando eu era adolescente, e faz anos que não o vejo. Sou a filha mais velha, e minhas irmãs ainda moram com minha mãe... pensei em visitá-las no Natal, mas sei lá, perdi a vontade.

- Sei. Este lugar... o que fazemos aqui.

Raquel se levantou e foi até a estante. Leu muitos dos livros ali dispostos, alguns até que possuía em sua coleção. Comentou o fato com André, e sentiu que ele passou a tratá-la com mais deferência depois disso.

- Acho que isso é o mais difícil daqui – disse ela. – Se escrevesse um artigo só com o que já descobri no sistema do Mundo do Céu Perfeito e seu buraco negro, e se pudesse provar naturalmente, teria lugar garantido em qualquer uma das melhores instituições acadêmicas do mundo!

- Sempre pensei exatamente o mesmo! E Lucas volta e meia comenta que prefere continuar no Projeto a fazer uma graduação, diz que aqui aprende muito mais – comentou André.

- Exatamente! Sandra comentou que conversou isso com ele enquanto estávamos no planeta.

A astrofísica disse que havia passado na sala de controle e examinado os últimos dados. Tudo transcorrera conforme ela havia programado os satélites, e um deles acompanhava a uma distância segura a trajetória daquele mundo. Um grupo de câmeras menores continuava a transmitir imagens da superfície do planeta, que permanecia tão incrível como eles haviam testemunhado.

- E veja só, os vídeos enviados desde a superfície parecem estar em câmera lenta – completou Raquel. – O contrário daquele que nos mandou. Aliás...

A moça voltou a se sentar e ficou encarando o cientista. Depois disse:

- Que raio de ideia foi aquela de mandar um vídeo!? Por que não uma mensagem de texto, que teríamos lido com muito mais facilidade?

O cientista a olhou, abriu a boca para responder, mas manteve o silêncio. Momentos depois respondeu:

- É verdade, deveria ter pensado nisso. É o modo habitual de comunicação com equipes lá fora. E na pressa ninguém lembrou da possibilidade de, em outro contínuo e ainda mais afetado pela gravidade...

Raquel riu alto, se sacudindo na cadeira. André riu também, e os dois ficaram assim por algum tempo.

O cientista finalmente sossegou, tornou a abriu o laptop e o virou para ela. Raquel se endireitou e examinou os dados, enquanto ele explicava:

- Os gráficos em nosso monitor de continuum mostram de fato uma anomalia associada ao sistema do Mundo do Céu Perfeito. Lembre-se que se trata de um buraco negro supermassivo um pouco menor que o de nossa galáxia, e essa foi a primeira vez que estivemos tão perto de um objeto assim.

- As teorias existentes dão conta de explicar alguns fenômenos – disse Raquel. – A dilatação temporal pela imensa gravidade distorcendo o tecido da realidade nas proximidades do buraco negro, principalmente.

- É provável que abrir um portal transdimensional nas proximidades de um local assim cause efeitos ainda não previstos – prosseguiu André. – A própria física do portal ainda é uma coisa cujo entendimento precisamos melhorar.

- Mas o que explica o que observamos no retorno?

- Não sei. Mas estive nas últimas horas pensando sobre este outro gráfico, que transferido para o monitor de continuum, comprova uma outra influência, além do portal aqui na base e do sistema onde vocês estavam.

Raquel observou os gráficos, estudou os dados, e em alguns momentos percebeu André a olhando de uma forma que ela nunca vira. Esboçou um sorriso involuntário antes de se controlar e perguntar:

- E o que descobriu sobre essa influência externa?

André recostou-se na cadeira, entrelaçou os dados atrás da nuca, olhou para o teto e respondeu:

- Por enquanto nada. Mas continuo estudando os dados e aguardando novas informações. É frustrante não saber, mas ao mesmo tempo isso é um incentivo para nunca parar de procurar respostas.

- É isso mesmo!

Raquel concordou com André, e eles ficaram em silêncio por algum tempo. Ela reparou que os olhos dele corriam dos cadernos em seu lado da mesa, onde também fizera anotações até ela, e por fim a moça levantou-se sorrindo.

- Bem, quase onze da noite – disse após consultar o relógio. – Vou passar no restaurante, soube que o pessoal preparou uma bela ceia, e estou com fome.

Ela se virou e foi até a porta. A abriu e estava a ponto de sair quando ouviu:

- Raquel... Feliz Natal.

A moça se virou, olhou para o rapaz e sorriu. Respondeu:

- Feliz Natal, André.

Raquel saiu, fechou a porta, e por um momento ficou pensando sobre aquele instante. Sorriu, um sorriso radiante de contentamento, e se dirigiu ao restaurante da base.

André tentou voltar a se concentrar no trabalho. Conferiu algumas equações em um caderno, mas tudo parecia se confundir diante da lembrança do adorável sorriso de Raquel. Fechou o caderno, apoiou os cotovelos na mesa e o queixo nas mãos, e pensou por um instante.

Percebeu duas coisas. Estava com fome, e sentiu uma estranha vontade de ver Raquel sorrindo de novo.

Ele riu, se levantou, saiu e apagou a luz do escritório antes de fechar a porta.


Nota do autor:

Vocês já conhecem Raquel Serendipi, astrofísica; Joana Medeiros, bióloga; Lucas Oliva, tenente; e Sandra Botelho, major. Além do cientista prodígio André Lozano. Todos eles aparecem em A Lista: Monstros, conto de minha autoria publicado em Monstros, antologia da Editora Buriti publicada em 2015. Espero que tenham gostado deste conto natalino e de ficção científica, já que as últimas histórias dA Lista publicadas aqui eram decididamente distópicas. Basta de problemas e temores com os noticiários atuais, concordam? Acho que nós fãs de Ficção Científica e Fantasia, assim como as demais pessoas, precisamos de mais escapismo, de mais incentivos para voltarmos a sonhar com um mundo e um futuro melhores. E nada melhor para isso do que uma aventura no velho estilo “audaciosamente indo onde ninguém jamais esteve”. E se preparem, pois é possível que no futuro próximo vocês os encontrem novamente, no romance dA Lista. Sonhar ainda não paga imposto!

Lembrando que continua disponível na Amazon o e-book A LISTA: FENDA NA REALIDADE.


Por sinal, o filme mencionado por Sandra não teve nada a ver com a elaboração deste conto! O que me inspirou foi uma imagem que vi dias atrás na parede da sala de espera da clínica oftalmológica onde aguardava uma consulta de rotina. É incrível como funciona a cabeça de um escritor, capaz de criar uma história a partir de uma imagem, que por sinal é esta:


Os últimos meses foram movimentados. Quem me acompanha nas redes sociais sabe que publiquei mais um e-book na Amazon, VÓ NENA E OS CAÇADORES: O LIVRO MALDITO. O retorno tem sido bom, o que inclui o prelúdio publicado no mesmo volume, Vó Nena e os Caçadores: O Diário de George Angelo, no qual presto uma homenagem ao mestre do horror cósmico H. P. Lovecraft. Nunca havia imaginado seguir o mesmo estilo e temas de outro autor, mas essa história me surpreendeu e agradou muito pelo resultado final. Confiram vocês também! E claro, a tag “Vó Nena e os Caçadores” está aí no final deste post para ser usada, combinado? Assim como “A Lista”.


E a melhor notícia de todas, a editora Underline Publishing irá publicar em 2021 meu romance CÉU DE GUERRA, uma história ao mesmo tempo Dieselpunk e de História Alternativa! Se pensaram na pergunta “o que aconteceria se...?” acertaram! Basicamente a trama, que se passa na Segunda Guerra Mundial, irá explorar o que aconteceria se fosse criada uma indústria aeronáutica no Brasil em meados dos anos 1920, por parte de certo famoso pioneiro da aviação. Outros detalhes ainda estão sendo acertados, mas esse lançamento já está cercado de expectativa, e espero que vocês apreciem tanto quanto eu. Foi uma grande surpresa e uma honra participar do anúncio da Underline Publishing na Bienal do Livro de São Paulo Edição Virtual anunciando a novidade! E vocês, claro, devem se lembrar do conto Céu de Guerra: a Batalha da Inglaterra, publicado na antologia Retrofuturismo da saudosa Tarja Editorial, que na prática funciona como prelúdio para o livro.

Assim deixo vocês, caros leitores, com um muito obrigado e os melhores votos de um Feliz Natal e um excelente Ano Novo (esperamos todos que seja MESMO muito, muito, MUITO melhor do que este).

Continuem nos acompanhando: @renatoa.azevedo, @mlzotarelli, @corujiceliteraria e @2sobrevoandoporai.

Até a próxima!

segunda-feira, 13 de julho de 2020

Vó Nena e os Caçadores: A Placa do Fusca Azul

Nota do autor: Este conto de terror com muita violência e sangue é dedicado a todos que já tiveram o dissabor de ter seu querido Fusquinha levado por vagabundos. Espero que seja ao menos um pequeno e catártico consolo.

Aquela dupla seguiu discretamente e a distância o Fusca Azul impecável logo que o viu passar na pequena estrada rural. Estacionaram antes de uma curva, e na posição em que estavam conseguiam ver, em meio às árvores e vegetação que cobriam as laterais da via, quando o carro estacionou e uma velha apoiada em uma bengala e um casal de jovens desceram.
Esperaram alguns instantes, e então voltaram a mover seu veículo, parando atrás do Fusca.
- Caraio, véio, está inteirão!
- Não tô gostando, já ouvi muitas histórias sobre Fuscas assombrados nesta região...
- Tá com medinho, é? Vai lá que a gente leva esse aí, ninguém mandou deixarem dando sopa!
O outro saiu, olhando para todos os lados, enfiou a ferramenta entre o vidro e a porta e conseguiu entrar no Fusca. Depois de fazer ligação direta o motor pegou, e os dois ladrões saíram em velocidade pela via de terra.


Dentro da propriedade Daniel ia à frente conversando com a proprietária do lugar, e enquanto sentia no caminho arborizado e florido as energias estranhas que pareciam mover os bizarros acontecimentos, razão pela qual haviam sido chamados, Tatiana segurou o braço de Vó Nena e cochichou:
- Vó, acho que ouvi barulho do motor do Fusca...
- Filha, garanto que isso não vai ser problema. Vamos resolver o que nos trouxe aqui, depois a gente vê.

O desmanche da quadrilha ficava a menos de oito quilômetros do lugar onde haviam roubado o Fusca, que agora era estacionado no meio de um grande galpão atulhado por peças de carros, carrocerias completas de um lado, e motores do outro. Mais cinco homens vieram receber os dois recém-chegados.
- Olha só que beleza, fazia anos que não via um desses!
- Caramba, acho que é um 1962 monocromático.
- Beleza, vamos começar a desmontar...
- Deixa de falar merda, moleque! Inteiro esse carro pode valer muito mais!
- Tem razão! Liga aí pro seu contato, aquele colecionador lá!
O que havia recebido a ordem apanhou o celular do bolso e logo começou a falar com um sujeito que frequentava o meio dos colecionadores de carros. Descreveu o Fusca Azul enquanto dava voltas ao redor do carro, depois parou diante dele.
- Ele tá perguntando a quilometragem.
O que dera a ordem de ligar para o colecionador, e que era o líder do bando, enfiou a cabeça pelo vidro da porta, que havia sido deixado aberto pelo ladrão que o trouxera, e observou o velocímetro.
- Diz pra ele que o hodômetro tá marcando... que merda é essa?
O líder do bando ficou espantado e imóvel por um instante, ao ver que os instrumentos do painel subitamente brilharam em um tom vermelho vivo.
E depois sentiu só uma dor terrível e súbita, antes de não sentir mais nada.
Os demais bandidos imediatamente começaram a gritar em pânico, vociferando palavrões e termos desconexos enquanto se afastavam do carro. Nem repararam que o motor havia ligado sozinho.
Estavam todos concentrados em contemplar a cena horrenda do corpo de seu chefe decapitado pelo rápido fechamento do vidro da janela, que desabou ao chão e ficou imóvel depois de poucos espasmos.
A porta do Fusca, tingida de sangue, abriu, e o horror deles aumentou quando viram sobre o banco a cabeça do sujeito exibindo uma expressão de terror nos olhos arregalados. O líquido vermelho gotejava pingando do assento.


Uma força invisível lançou a cabeça sobre os dois ladrões que estavam ao lado do Fusca. Dois dos que estavam na frente do carro sacaram as armas e atiraram nele enquanto gritavam.
- Mas que merda é essa? Caralho, o que essa coisa fez com o Mané?
Os tiros furaram a lataria do Fusca e estilhaçaram os vidros. Quando as armas ficaram descarregadas, para espanto de todos os seis ainda vivos, os vidros se refizeram após os estilhaços voarem de volta para o carro, e sua lataria fechou os buracos, ficando como nova.
- Olha... olha a placa! NEN 42...
- Que merda você tá falando?
O Fusca acelerava, arrastando um pouco os pneus. Seus faróis brilhavam em um intenso tom de vermelho.
- NEN 4 parece Nena... Tem uma lenda na região sobre uma bruxa chamada Nena, que dirige um Fusca amaldiçoado! Não pode ser...
O Fusca arrancou, avançando contra os dois que haviam atirado. Um deles não teve tempo de correr, e os demais viram como se fosse em câmera lenta o terrível impacto atingi-lo, dobrando-o ao meio e partindo seu crânio sobre o capô do Fusca.
O cadáver escorregou lentamente e caiu ao chão, deixando o capô e o para-brisa cobertos de uma mistura de sangue e miolos.
O impacto atingiu um guincho que segurava um pesado motor de caminhão. O outro bandido que atirara, atônito com a cena horrenda que presenciou, mal teve tempo de olhar para cima antes de ser atingido e esmagado pelo motor.
Restavam outros quatro ali, imobilizados pelo horror e pelo pavor. Uma televisão sobre uma escrivaninha ligou de repente, e movidos por uma força incompreensível eles se voltaram para ela.
Em uma cena em uma prisão, após derrubar outro prisioneiro, um personagem diz aos outros:
- Vocês não entendem. Eu não estou trancado aqui com vocês. Vocês estão trancados aqui comigo!
Os ladrões olharam para o Fusca Azul. O tom vermelho vivo de seus faróis ficou ainda mais intenso, o motor acelerou e o carro amaldiçoado avançou contra eles.

Quem estivesse fora do galpão naquele momento, em meio às luzes minguantes do crepúsculo, teria ouvido gritos aterrorizantes de puro horror e dor, o som de um motor roncando alto e pneus guinchando, e objetos de todos os tamanhos sendo derrubados.
Em segundos tudo ficou em silêncio. Os gritos emudeceram, dando a certeza de não haver mais nada vivo dentro do galpão.
O ruído de motor foi ouvido de novo, e com um impacto as portas do galpão foram abertas. O Fusca Azul saiu e parou, e pouco da tonalidade em sua carroceria era visível, já que em grande parte estava tingida de sangue.
Vidros de janelas e faróis se consertaram, a lataria voltou a ficar alinhada, e o sangue que cobria o carro começou a desaparecer, como se sugado para dentro do metal. Uma mão decepada com somente quatro dedos e outros restos humanos no para-brisa foram varridos para o lado pelos limpadores.
O Fusca saiu lentamente pelo caminho de terra, mas depois de alguns metros parou. A antena instalada à frente da coluna esquerda do para-brisa começou a ser recolhida devagar.
Um olho fincado em sua ponta desceu junto com a antena, e quando esta desapareceu dentro de sua base ele caiu e rolou pelo chão.
O olho ficou observando enquanto o impecável Fusca Azul se afastava pela estrada de terra, suas luzes traseiras logo desaparecendo na noite.

Daniel, Tatiana e Vó Nena voltavam pelo caminho da propriedade, satisfeitos por mais um caso resolvido. O rapaz já ia dar pela falta do Fusca Azul, quando o carro veio devagar e parou diante do portão.
Os três entraram nele, o moço no banco traseiro e as duas na frente. Nena pediu a Tatiana para dirigir.
A jovem vidente, desde a primeira vez que andara naquele carro, sentia coisas terríveis relacionadas a ele. Daquela vez definitivamente havia algo, mas ela notou que a alma penada que o assombrava a impedia de ver tudo.
Vó Nena percebeu, colocou a mão sobre a de Tati, e disse:
- Não se preocupe, filha. Este carro safado sabe muito bem que ai dele se fizer mal a uma pessoa boa. Nem se preocupe com isso, até acho que de vez em quando ele precisa se divertir um pouco. Quem sabe se essa sina dele não faça com que ele preste algum bom serviço, não é mesmo?
Tatiana olhou para ela, sorriu, e virou a chave. Fez o carro dar uma volta e retornaram pela estrada de terra. A viagem de volta para casa terminou sendo bem agradável, ouvindo causos de Vó Nena.

Vó Nena e os Caçadores retornarão.


Espero que tenham gostado deste conto de terror! Se quiserem saber mais a respeito do universo de Vó Nena e os Caçadores confiram pelas tags abaixo. E claro, leiam como tudo começou com o carro mais assombrado do Brasil em VÓ NENA E OS CAÇADORES: O FUSCA AZUL.


Apesar da situação geral, essas últimas semanas foram muito movimentadas! Vó Nena e seu Fusca Azul ainda tomaram parte de outro projeto, unindo arte em forma de ilustrações e contos, no magnífico site Contos de Vampiros e Terror, iniciativa dos amigos Adriano Siqueira e Maria Dutra. Cliquem aqui para conferir!

E a maior novidade sem dúvida é a Coleção Fênix de Literatura Fantástica! Iniciativa de Richard Diegues, que foi meu editor nos bons tempos da Tarja Editorial, o projeto se destina a produzir e-books gratuitos, repetindo, GRATUITOS, para incentivar a leitura nestes tempos difíceis que atravessamos. Exatamente o que sempre foi o objetivo deste Escritor com R!

Confira a página da Coleção Fênix no Facebook, e os e-books podem ser baixados (de novo, gratuitamente), clicando aqui ou então na Amazon, onde já estão disponíveis o Volume 1, Volume 2 e o Volume 3.



Lá no Corujice Literária temos publicado muitas resenhas, e ainda uma série especial de entrevistas com vários quadrinistas, confira que está muito legal!

Não deixe de acompanhar essas e outras novidades no nosso Instagram.

Até a próxima!

UPDATE! Já saiu o Volume 6 da Coleção Fênix, com minha segunda participação no projeto. Confira esse e os volumes anteriores clicando aqui.

quarta-feira, 15 de abril de 2020

MENSAGENS DA LISTA


De: Jade
Para: A LISTA
Assunto: A doença que veio da China

Amigos e colegas, aconteceu! Não adiantaram protestos, alertas, nem muito menos serviram de aviso contra as epidemias e pandemias anteriores.
Uma nova ameaça surgiu, um vírus que ataca o sistema respiratório e se dissemina com velocidade impressionante.
Como aconteceu nas ocasiões anteriores, o governo totalitário da China acobertou e tentou impedir a divulgação de informações sobre o surto em seu território, contando com a cumplicidade da Organização Mundial de Saúde. O resultado é que, cinco meses depois, a quarentena forçada de boa parte da população mundial não tem data marcada para terminar.
Dois milhões já morreram em meu mundo, e os hospitais estão sobrecarregados. Mas não é esse o principal problema.
O problema é que a China usou, evidentemente, da brutalidade própria de uma ditadura para manter as pessoas em casa, e seus métodos têm sido mais e mais copiados pelo restante do mundo.
Quando a doença se tornou um problema insolúvel de saúde pública em seu país de origem, os chineses puseram os militares na rua, atirando nas pessoas que saíam de casa.
Mas em países mais desenvolvidos as coisas foram muito diferentes. Afinal, nos tornaram dependentes de celulares, cuja função de geolocalização não pode ser desligada. E para quê arriscar a saúde de soldados quando se possui drones armados?
O pior mesmo foram aqueles que sempre alegaram defender a democracia e serem “antifascistas”, e que aplaudiram tais determinações de vários governos. É impressionante a quantidade de gente, tanto aqui quanto nos mundos dos colegas da Lista, que acreditam que é benéfico, diante de certas circunstâncias, abrir mão de direitos ou de alguma liberdade.
Ou mesmo de toda liberdade.
Pois se todos estão sendo monitorados, por que não se aproveitar disso e manter vigilância cerrada contra adversários? Críticos do regime? Artistas que se recusam a ajoelhar-se diante dos donos transitórios do poder?
As notícias sobre estranhos desaparecimentos de opositores, dissidentes e artistas independentes só aumentam. Isso quando circulam, claro, pois com todos em casa usando a internet, lentidão na rede e eventuais quedas se tornaram comuns, facilitando o controle.
Ainda mais com tanta gente se dizendo “a favor da vida” e disposta a controlar a vida dos vizinhos, denunciando qualquer um que não respeite as regras.
A liberdade e a democracia, por vezes, morrem debaixo de aplausos. Estou a cada dia mais apavorada, não com o vírus mas com as pessoas.


De: Elton
Para: A LISTA
Assunto: Re: A doença que veio da China

Isso é de verdade? Mesmo?
Vocês estão, cada um de vocês, em uma dimensão paralela diferente da minha?
Isso... isso... Nem sei o que dizer! Faz meses que não tenho contato com um ser humano!
Estou abrigado em um antigo bunker, construído na época da última guerra. Na minha última saída em busca de comida, não vi qualquer outra pessoa. A pequena cidade do interior na qual estou também foi atingida pela doença.
O mundo inteiro, meu mundo inteiro, foi.
Este bunker foi transformado em uma biblioteca, e eu era um dos bibliotecários. Os livros, milhares deles, têm sido minha companhia por esses meses que estou aqui.
Comecei a anotar os dias e montar um calendário em papel, com medo de que a energia acabe. No meu mundo as máquinas operam automaticamente, o que tem permitido que nos comunicássemos nos últimos tempos, quando eu ainda conseguia falar com os outros.
Devo estar aqui há quase um ano, saindo somente quando a comida se aproxima do final. E tenho sido obrigado a caminhar cada vez para mais longe para encontrar meios de sobreviver.
Aqui o desastre global teve início de forma muito parecida com o que Jade comentou. A diferença é que medidas autoritárias foram implementadas mais depressa, pois o vírus se espalhava com maior velocidade. O primeiro surto global da pandemia passou depressa, mas em um mês outro teve início, e o ciclo se repetiu depois.
Foi a partir do terceiro e último surto que decidi me refugiar na biblioteca, pois a violência e os saques se tornavam piores a cada dia. Boatos de que o vírus, nessa fase, desencadeava comportamento violento provocaram pânico e todos queriam se armar.
Faz dois meses que não tenho qualquer contato com alguém. Sites de notícias estão desatualizados ou fora do ar. Não achei qualquer comentário novo nas redes sociais ao longo de todo esse tempo.
Até surgir A Lista. Ler suas mensagens e trocar informações com vocês tem sido um alento em minha solidão.

De: Kai Jaho
Para: A LISTA
Assunto: Re: A doença que veio da China
Anexo: Vídeo Manifesto de Kai Jaho

Meus amigos, tenho participado muito da Lista, e quero agradecer a todos vocês por todo esse tempo de convivência.
Como sabem, além de escritor nas horas vagas, sou biólogo e virologista. O que ainda não lhes havia revelado é minha participação no programa de armas biológicas da China, meu país.
Mal posso começar a descrever a vocês o controle estrito aplicado por nosso governo contra a sociedade. Muitos dos amigos de outras realidades descreveram situações bem similares. É sufocante, assustador, aterrorizante.
Por meio de minha ficção, eu conseguia me libertar um pouco. E, como alto funcionário governamental, ainda gozo de um fiapo de liberdade a mais que meus concidadãos.
O que faço? Trabalho no programa chinês de armas biológicas. Coisa que me enche de vergonha, transformar a ciência que aprendi em arma. Mas das pouquíssimas liberdades de que desfrutamos, recusar o chamado de auxiliar no desenvolvimento dessas armas obscenas, quando se é brilhante na área, não é uma delas.
Aqui, assim como em muitos outros mundos conforme as descrições dos colegas da Lista, igualmente aconteceu uma pandemia. Evidentemente meu governo chinês também acobertou por todo tempo quanto foi possível, permitindo como resultado que o mundo fosse atingido pelo vírus.
Colegas médicos, como meu querido amigo Li Wenliang, foram censurados por seu desejo de alertar a comunidade internacional. E meu amigo pagou o preço final, sendo deixado para morrer quando contraiu a doença. Claro que todos nós, experts em biologia e virologia, fomos chamados para combater a ameaça quando esta se mostrou séria.


Além disso, como funcionário de um programa bélico estratégico, a filiação ao Partido Comunista é obrigatória. E nesse meio, entre as discussões sobre a epidemia que já se espalhava além de nossas fronteiras, surgiram as primeiras sugestões de como transformar esse desastre em algo favorável para a China. Os resultados... bem, os amigos estão descrevendo em suas mensagens, e em meu mundo, em graus variados de similaridade, muitos desses fatos se desenrolaram da mesma forma.
Amo meu país. Amo meu povo, minha família e amigos. Mas não posso mais tolerar que essa mentalidade prossiga. Prejudicar o restante do mundo em nosso benefício é intolerável, e sinto uma vergonha imensa por isso. Os protestos contra a China se intensificam, e afirmo com toda convicção que são absolutamente justificados.
Isso não pode ficar sem punição. E não ficará.
O Congresso do Partido Comunista está se aproximando, estou em um hotel em Pequim, e devo sair em instantes para participar. Comigo levo uma cápsula da mais mortífera bactéria já desenvolvida por nossa engenharia genética, apelidada de “devoradora de carne”, com grau de letalidade e velocidade de propagação que não ouso comentar com vocês.
Depois que eu ingerir a cápsula, quando estivermos todos reunidos no Congresso, será questão de minutos. A ação da bactéria será rápida, e ela atacará boa parte de Pequim. Colegas meus estão preparados para fazer o mesmo, em várias cidades importantes, caso o governo chinês não concorde em assumir sua integral responsabilidade neste desastre.
Conforme afirmo no vídeo que em breve será espalhado pela internet, faço isso por vergonha das ações de meu governo. Um governo que em suas ações de autêntico terrorismo mostrou ser uma ameaça para o mundo. Esta ameaça acabará hoje.
Muito obrigado, meus amigos, e adeus.

De: Daniel
Para: A LISTA
Assunto: Re: A doença que veio da China

Kai, lamento muitíssimo sua partida, e torço para que seu sacrifício não seja em vão!
Em minha realidade a disseminação do vírus foi rápida, a pandemia afetou todos os países e a China, detendo o monopólio de equipamentos, produtos e remédios contra a doença, prosperou enquanto o restante do mundo penava.
Adquiriram empresas, aumentaram sua influência global até governos começarem a implementar seus métodos de controle totalitário sobre a sociedade.
Alguns resistiram, como Estados Unidos e Grã-Bretanha, além de focos em vários outros países.
Meu Brasil, infelizmente, foi uma das nações que não se livrou do aumento da influência chinesa, da censura e do totalitarismo.
Já são quatro anos vivendo, ou melhor, sobrevivendo assim.
Mas o progresso e o dinheiro deixaram o governo chinês arrogante. Compram tudo e todo mundo, até seu próprio povo, mas deixaram de lado o desenvolvimento científico que possibilitou esse progresso.
A astronomia foi uma das baixas nesse período insano. Mas nós, aqui fora, continuamos trabalhando. E, se não conseguimos fazê-los pagar pelo que fizeram, ao menos poderemos vingar aqueles que eles, na prática, mataram.


Todos perdemos alguém. Muitas vezes mais de um ente querido.
Uma missão, anunciada como científica, foi lançada cerca de dois meses atrás. Mas o contato foi interrompido horas depois do lançamento. Isso foi o que anunciamos, claro.
As pequenas sondas se comportaram exatamente como previsto. Encontraram o asteroide 14MAR2020 na posição prevista, pousaram em sua superfície firmando-se bem, e acionaram seus propulsores.
Trata-se de uma rocha espacial de cerca de 300 metros de extensão no lado maior. E feita quase inteiramente de ferro.
Conhecido há um bom tempo, é um dos muitos corpos que se aproximam da Terra periodicamente. E que nesta ocasião é invisível na porção oriental do planeta, pela aproximação máxima se dar no lado diurno de nosso mundo.
Dois meses de manobras para tirar o asteroide de sua órbita.
E fazê-lo rumar para Pequim, no preciso dia do Congresso do Partido Comunista.
Uma rede de astrônomos amadores ao redor do mundo, claro, observou o estranho comportamento do asteroide. Mas a maioria deles também perdeu pessoas para essa doença maldita. E por isso nada disseram quando fizemos circular as notícias.
Até Estados Unidos e Grã-Bretanha estão nos ajudando.
O asteroide está entrando na atmosfera enquanto digito estas apressadas linhas para vocês.

De: Mariy
Para: A LISTA
Assunto: Re: A doença que veio da China

Falar com meus amigos da Lista tem sido um alento nestes tempos. Meu mundo, da mesma forma que os de vocês, foi atingido pela pandemia vinda da China.
Estamos há quatro meses em confinamento, saindo somente para comprar o que é estritamente necessário. Passo os dias com medo, e escrevo nos momentos de folga para fugir um pouco desta realidade.
Publico meus textos em um blog e nas redes sociais, mas também aqui, como muitos de vocês descreveram, governos têm seguido o exemplo totalitário das ditaduras. Vários de meus escritos foram apagados, e sequer se pode escrever “China” com conotação negativa para também sofrer censura.


Um amigo meu, forte crítico do comportamento do governo chinês, chegou a ser banido da internet por um mês. Imaginem, todos obrigados a ficar em quarentena, e ele um mês incomunicável! De nossa turma fazia parte um hacker, e ele conseguiu elaborar perfis falsos para aquele amigo manter-se conectado.
Mas até isso o governo está combatendo. Alegando defender a sociedade contra “fake news” e boatos, investiram uma quantia considerável para contratar hackers a fim de rastrear, localizar e identificar quem pratica o que consideram ilegalidades. Dinheiro que poderia ir para a saúde gasto para nos censurar!
Estamos criando uma rede social livre, mas dois protótipos já foram neutralizados pelos agentes cibernéticos.
Nas ruas, então, a situação está cada dia pior. Vigilância por meio de localização de celulares, drones patrulhando as cidades, eles se preocupam mais em tolher nossa liberdade do que investir em uma cura, ou em melhoras para hospitais.

De: Samanta
Para: A LISTA
Assunto: Re: A doença que veio da China

De todas as consequências dessa pandemia que os colegas descreveram, não vi ainda uma sequer que se compare a do meu mundo.
A doença se alastrou a partir da China, como nas realidades de vocês. Medo, morte e desespero faziam parte de nossas vidas, enquanto enclausurados em casa esperávamos por uma cura.
A pandemia, por incrível que pareça, desapareceu depois de poucos meses. Mas algo pior, muito pior, surgiu.
Também a partir da China, chegaram relatos para os quais custamos a dar crédito. Os comunistas sempre foram mestres na arte das mentiras contadas como se fossem verdade, ou notícia. Mas logo fontes independentes confirmaram os boatos.
Primeiro Wuhan, e depois Xangai, foram devastadas por ataques inexplicáveis. Sombras imensas apareciam nos poucos vídeos que vazaram, pois o governo chinês, mais uma vez, tentou de todas as formas acobertar o fato.
Correspondentes internacionais em Pequim e nas proximidades relataram impressionantes movimentações militares, e na periferia da cidade sombras colossais, contra os quais os tanques disparavam, foram avistadas.


Já havia sido descoberto que o vírus fora resultado de uma mutação, e que atacava animais também. Insetos, répteis e moluscos eram os mais suscetíveis.
O que eles tanto tentaram esconder, muito mais do que o vírus, o mundo tomou conhecimento de forma absolutamente brutal. Seres colossais, derivados de seus parentes menores das classes mencionadas, passaram a percorrer a China devastando tudo.
Só posso dizer que quem teve familiares perdidos por causa do vírus, cuja pandemia poderia ter sido evitada não fosse o acobertamento pelo governo chinês, não ficou tão triste pelo ataque dos insetos monstruosos.
Quanto mais os militares chineses matavam os monstros, mais destes surgiam. Lagartos gigantescos lutavam contra imensas aranhas nas cercanias das maiores bases da Marinha chinesa, e eles decidiram enviar todos os seus navios de guerra para o mar. Porém foram todos dizimados por colossais cefalópodes que os encontraram.
Outros navios foram atacados no Pacífico, e agora o mundo inteiro tenta formar uma coalização para tentar combater essa ameaça. A China entrou em total colapso, não se sabe mais quem está no governo, se é que algum membro deste sobreviveu, e há um temor muito forte quanto a seu arsenal nuclear.
Lembro bem quando, anos atrás, alguns mundos de membros da Lista foram atacados por criaturas gigantescas. Será que algum desses colegas pode se manifestar e apresentar sugestões?

De: Elton
Para: A LISTA
Assunto: Re: A doença que veio da China

Ainda estou abismado com tudo isso! Outras realidades, outros universos!
Como isso acontece? Como suas mensagens, fotos, vídeos e arquivos chegam até meu computador? Não há absolutamente nada diferente nele! Já li mensagens falando de um Moderador.
Quem é ele? O que quer? Além da troca de informações e experiências, o que mais pretende conseguir com esse contato entre universos?
Desculpem a demora em responder. Fui fazer a ronda no bunker, e o tamanho dele é considerável.
Adquiri o hábito de ler clássicos do terror, pois chegam a me confortar nestes tempos sombrios. Não consigo acreditar que estou totalmente sozinho aqui?
Nada, nenhuma notícia do mundo exterior tem chegado. E como disse antes, faz tempo que não vejo mais ninguém.
Em minha ronda pensei ter ouvido ruídos no portão dianteiro. Algo como batidas. Ou posso estar somente impressionado com suas histórias. E os livros que tenho lido.
O que foi isso?
Parece que vi movimento!
Tenho algumas câmeras ligadas ao computador, focalizando vários pontos da área externa. Acho que vi alguma coisa se movendo.
Não, deve ser minha imaginação.
Estou chocado com as notícias de seus mundos! Guerra, mortes, tanto medo, tanta desgraça! Será por isso que existe a Lista? Para nos confortarmos?
De novo! Agora tenho certeza! Barulho na parte externa, no portão da frente!
Amigos, preciso ir. Há saídas secundárias, e caminhos que posso percorrer sem ser visto, se é que existe algo lá fora que possa me ver.
Estou com muito medo, mas não tenho escolha. A comida está no fim mesmo, preciso sair.
Torçam por mim.

De: Zhi Tao
Para: A LISTA
Assunto: Re: A doença que veio da China

Olá, amigos da Lista. Sou a substituta de Kai Jaho, pois como devem ter antevisto, pela última mensagem dele e pelo vídeo que enviou, o plano custou sua vida, mas funcionou como previsto.
Ele ingeriu a cápsula e minutos depois, em meio à reunião do Partido Comunista, seus efeitos se instalaram. As bactérias se espalharam com rapidez, mesmo em meio ao pânico, com os membros correndo para tentar escapar, e todos no anfiteatro estavam mortos em questão de minutos.


Aqueles que conseguiram sair contaminaram militares e oficiais de segurança, além de outros funcionários na parte externa do anfiteatro. Ao final boa parte do centro de Pequim foi devastada, e o vídeo de Kai circulou sem controle pela internet. A alta cúpula militar, presente ao evento, foi igualmente exterminada, e militares de ranking mais baixo não souberam o que fazer, apesar de alguns, alegando se tratar de ataque estrangeiro, ameaçarem com uma retaliação nuclear.
As potências de meu mundo ameaçaram então com uma resposta devastadora, e diante dos fatos revelados no vídeo de Kai, estão obrigando a China a pagar reparações pelo que fez ao mundo.
Enquanto isso associados nossos continuam de plantão, anônimos e dispostos ao auto sacrifício, nas mais importantes cidades. O perigo ainda não passou, mas tenho esperança que o sacrifício de Kai Jaho não será em vão.

De: Ariel
Para: A LISTA
Assunto: Re: A doença que veio da China

Colegas da Lista, meu mundo também foi atingido pela doença, e também existe a certeza, embora alguns não a reconheçam, de que foi uma tramoia dos malditos comunistas. Muitos são contra uma retaliação, alegando interesses políticos e econômicos.
Em minha realidade a pandemia já dá sinais de diminuição na velocidade do contágio, e agora o mundo começa a sentir os efeitos da dura recessão que já se instala. Milhões de desempregados, poupanças de toda uma vida esgotadas, desespero total. Enquanto isso a China, com o monopólio de alguns dos produtos necessários para uso nos hospitais, ainda cresce.
Vozes falam de guerra, ao menos de sanções e reparação, mas são rapidamente caladas. Os políticos no Ocidente prosseguem com sua covardia disfarçada de pragmatismo.
Eu e muitos colegas cansamos disso.
Trabalhei muito tempo em um programa secreto de armas orbitais, chamado por alguns de Varas de Deus, mas entre nós conhecido como Lanças do Destino.


São lanças de tungstênio, extremamente densas e resistentes, de cerca de seis metros de comprimento e 20 cm de diâmetro. Tanto elas quanto o satélite que as abriga são cobertos por tinta refletora de ondas de radar, e fortemente protegidos do infravermelho. Conseguimos suplantar os programas de segurança, e o estamos acionando agora.
O satélite orbita a quase 1.000 km de distância da superfície terrestre. Impulsionadas a foguete, as lanças literalmente caem verticalmente, em velocidade hipersônica, e o impacto causa uma devastação comparável a uma arma nuclear de potência média.
Acabo de receber a confirmação, as primeiras já foram lançadas. Os chineses terão de volta o prejuízo e a dor que causaram ao restante do mundo.

De: Otávio
Para: A LISTA
Assunto: Re: A doença que veio da China

Onde está mesmo aquela outra, tão preocupada com o meio ambiente?
Por onde anda a Greta Thunberg, mesmo?
Eu posso responder, já que nenhum dos colegas descreveu se seus duplos, que algum tempo atrás pareciam se alastrar em outras realidades como uma praga, reclamou que a China “roubou seus sonhos”.
Aqui, durante a pandemia, como imagino que tenha acontecido nas realidades dos amigos, o meio ambiente mostrou uma melhora considerável. A poluição diminuiu a níveis de muitas décadas atrás, a vida animal se recuperou e até mesmo espécies extintas deixaram a lista de formas de vida ameaçadas.
Mesmo os cientistas estão surpresos com a forma como o planeta se recuperou, diante da quarentena forçada da raça humana.
Com a descoberta de uma vacina e o final do confinamento, todos voltamos a dar duro no trabalho, pois a recessão e penúria econômica são uma realidade triste agora. Mas a calmaria não durou para sempre.
Ataques terroristas coordenados passaram a ocorrer, ceifando vidas em várias cidades pelo mundo, especialmente em locais ocupados por instituições financeiras e órgãos públicos. Após uma semana repleta desses assassinatos em massa, eis que um vídeo começou a circular.
Achei que os absurdos relatados na troca de mensagens dos amigos sobre Greta Thunberg seriam algo do qual estaríamos livres aqui. Como me enganei!


Pois sua duplo, em meu mundo, ocupou boa parte dos noticiários dizendo que estava liderando os ataques para proteger o mundo da “praga humana”, como a chamou.
Naturalmente todos os governos, aqueles civilizados bem entendido, se lançaram à caça dela e de seus comparsas. Infelizmente sua lábia, ou melhor dizendo a habilidade dos que escrevem seus discursos, é muito envolvente, e mais e mais pessoas acabam convencidas disso.
Guerra civil, pura e simples, já explode em vários países. Não tenho como descrever o absurdo que é a atitude desses “defensores do planeta” que conseguem argumentar a favor de assassinato em massa em nome de sua “causa”. Está difícil escrever ficção, quando a realidade já mostra algo tão inacreditável assim.

De: Jair
Para: A LISTA
Assunto: Re: A doença que veio da China

Caro Otávio e amigos, a recessão, como descreveram, chegou forte e devastadora a meu mundo, e ainda estamos em meio à pandemia. A guerra civil, ao que parece, também já eclodiu aqui em meu Brasil.
O estopim não foi nenhum acontecimento de alcance global como os que descreveram. Foi algo ao qual até já estávamos acostumados aqui, como a população de muitos outros Brasis dos amigos também está. Falo da exploração a qual a sociedade é submetida pelos “donos do poder”, e que chegou a níveis absolutamente doentios aqui.
O ápice se deu há três dias. O irmão mais velho do ministro do Supremo Tribunal Federal Sandro Mayarovsky foi acometido pelo vírus e deu entrada na emergência do principal hospital do Rio de Janeiro. Todos os leitos de UTI e respiradores já estavam ocupados por vítimas do vírus, porém Mayarovsky emitiu uma medida cautelar ordenando que os médicos internassem seu irmão no leito de um paciente que tivesse poucas chances de recuperação.
Os médicos do hospital se recusaram terminantemente, claro, mas o juiz não se deu por vencido, mandou que agentes federais, sob o comando de um delegado velho amigo seu, obrigassem os médicos sob mira de armas a tirar do leito uma mulher que apontaram a esmo.
O irmão do juiz foi colocado ali, e a mulher morreu poucas horas depois. O nome dela era Helen Abreu, era uma professora e muito conhecida por ter protegido seus alunos de um assalto sofrido por sua escola.
Esse fato foi a gota d´água para a população.
O condomínio de luxo onde morava Mayarovsky foi invadido, ele foi arrancado de casa por uma turba enfurecida e linchado no meio da rua ali mesmo. Outros ministros do STF, aqueles alinhados com ele, estão sendo caçados pela população em várias cidades, e os tumultos estão crescendo em todo o país. Vários congressistas que foram contrários ao uso de suas verbas públicas de propaganda eleitoral estão aparecendo mortos e também linchados.
O exército está nas ruas, muitos soldados estão mudando de lado e lutando ao lado da população. Não se faz a menor ideia de para onde isso vai.

De: Judith
Para: A LISTA
Assunto: Re: A doença que veio da China

Otávio e amigos da Lista, já digo onde isso vai parar. A guerra civil já chegou aqui.
A recessão econômica ainda durante a pandemia tornou ainda mais escandalosos os privilégios dos políticos, juízes e funcionários públicos.
A câmara de deputados de São Paulo aumentou os próprios salários. Isso foi o estopim. A população só poupou aqueles que votaram contra a medida. Os corpos daqueles que aprovaram o abuso foram estendidos diante do prédio da câmara.
Lá em Brasília os tumultos começaram já violentos. O presidente do Senado, Eduardo Barnardes, que se manifestou várias vezes contra o uso da verba do fundo eleitoral no combate à epidemia, foi assassinado em casa, e seu corpo arrastado pelas ruas. O presidente da Câmara, Sergio Novais, que repetidamente afirmou que o fundo eleitoral era “essencial para manter a democracia”, foi encontrado no próprio Congresso, espancado e depois empalado diante do prédio.


O presidente do Supremo Tribunal Federal, Enzo Tavares, que deu seguidas declarações sobre a necessidade de manter as altas despesas, salários e privilégios dos juízes como forma de “garantir a harmonia entre os poderes e o bom funcionamento da justiça”, foi linchado e seu corpo colocado diante da estátua da Justiça, na frente do STF.
A população enlouquecida está caçando todo político, juiz ou pilantra privilegiado do setor público para fazer justiça com as próprias mãos. Não me alegro com tamanha violência, e um “mas” é a pior palavra que se pode acrescentar agora. Mas eles poderiam ter feito a parte deles, e preferiam se mantiver como uma classe à parte.

De: Célio
Para: A LISTA
Assunto: Re: A doença que veio da China

Meus amigos, estou horrorizado com os fatos que descrevem. É estarrecedor constatar como eventos como esses parecem transcorrer de forma quase simultânea em muitas das paralelas. Seria essa uma lei do Multiverso que ainda não conhecemos?
Seria a descoberta dessas leis que regem a totalidade da Realidade um dos objetivos do Moderador e da própria Lista?
Pois em meu mundo uma epidemia igualmente grassou, e foi particularmente devastadora. A mortandade entre a população das grandes cidades foi terrível, e ver corpos largados nas ruas, nas fotos ou vídeos da TV e internet, absolutamente chocante.
Aqui, como em outras realidades, aqueles pequenos candidatos a ditador de sempre se aproveitaram da situação para tentar implementar políticas totalitárias de controle.
Houve violência, houve caos.
Muitas ruas ainda estão tomadas por corpos.
Mas estamos sobrevivendo. Muitos governos centrais foram dizimados pela pandemia, e o comando em muitos países, incluindo o Brasil, recaiu sobre uma coalizão de líderes de pequenas cidades.
Limpar ou não as grandes cidades para uso futuro não tem sido a prioridade. Agora o importante é garantir nossa sobrevivência, e enviamos nossos emissários para as metrópoles apenas para trazerem de volta o que é absolutamente necessário para reconstruirmos.
Os benefícios do controle das pequenas comunidades parece que está se tornando mais e mais evidente, inclusive mundialmente. Uma maior e mais ampla cooperação está se estabelecendo, em níveis inimagináveis antes da pandemia.
O vírus, ao menos, teve esse benefício. Ele levou embora maus líderes, que faziam a guerra ou nunca se preocuparam com a humanidade como um todo.
Inevitáveis disputas e desavenças surgem, mas diante do estado de penúria global deixado pela pandemia, acredito que estamos nos saindo bem. As notícias sobre pessoas passando fome diminuíram consideravelmente nas últimas semanas.
Escritores como eu estão cada vez mais celebrados, pois nossas obras têm auxiliado as pessoas nestes tempos difíceis, mostrando mundos melhores, sonhos que valem a pena sonhar.
Continuo preocupado, e mandando os melhores votos a todos os colegas da Lista, para que também encontrem um caminho para reconstruir e viver em paz.
E alguém tem notícias do Elton?

A Lista retornará.


Gostaram de mais essa série de As Mensagens dA Lista, o spinoff de seu Multiverso preferido? Manifestei aí um dos melhores lados de ser um escritor, os entendidos entenderão.

Nos acompanhem: @renatoa.azevedo, @mlzotarelli e @corujiceliteraria.

A Lista tem outras histórias neste blog, os marcadores abaixo estão aí para serem usados. E não deixem de conferir os ebooks disponíveis:



Até a próxima!