— Calma, senhorita, estamos aqui pra averiguar somente.
— Que zorra é essa?
Vó Nena entrou no hospital, acompanhada do neto Daniel e da namorada deste, Tatiana, mas não estava preparada para a cena.
Uma mulher histérica, cercada por enfermeiros e policiais, berrava que tinham que tomar cuidado com seu bebê.
— Ela trouxe o marido com uma faca enterrada no ventre — explicou o delegado Esperidião, — suspeitamos de briga de casal, mas... o homem conseguiu dizer que foi o tal bebê.
— E o que tem o bebê? — perguntou a Caçadora.
— É que... — o policial hesitou — é um boneco.
A mulher berrou mais, dizendo que seu filho não era uma coisa, enquanto o delegado acrescentou que um guarda o tinha levado para outra sala. A mulher continuou berrando, exigindo uma enfermeira da maternidade e apoio psicológico.
— Calma, senhorita Barroso...
— Dessa família, ainda por cima? — perguntou Vó Nena. — Estão na política da cidade há décadas e nunca fizeram nada que prestasse. E que merda é essa de boneco, Esperidião?
Os dois foram para um canto, e o delegado explicou. A Caçadora não se conteve:
— A porra de um boneco, e essa dondoca o trata como um bebê? Tá de brincadeira!
Esperidião chamou pelo rádio o policial que levara o tal bebê, mas não obteve resposta. Daniel seguiu para a sala indicada e logo gritou. O homem estava caído, um profundo corte no flanco, e enquanto era socorrido balbuciou que o boneco o atacara com um bisturi e levara sua arma.
Tatiana e Vó Nena se entreolharam, e pela expressão da jovem vidente a veterana Caçadora soube imediatamente do que se tratava.
As duas seguiram por um corredor, enquanto Daniel se dirigiu para o outro lado.
De repente gritos e tiros. As Caçadoras correram, e encontraram o tal bebê em pé no corredor e disparando contra uma porta.
A coisa, de fato produzida com um realismo impressionante, olhou para eles no momento em que Tatiana sacou sua pistola com balas de prata. Dois tiros após uma ligeira hesitação, e um acertou o bebê. Mesmo assim ele correu, desaparecendo na curva do corredor. A vidente foi atrás.
Vó Nena abriu a porta, que era de um depósito, e encontrou duas enfermeiras e uma médica encolhidas em um canto, aterrorizadas. Ela disse:
— Fiquem aí, moças.
Tati retornou e comentou:
— Tentei seguir a coisa, mas sumiu.
Por seu lado, Daniel ouviu os tiros, quis correr mas logo recebeu no celular uma mensagem da namorada, dizendo que tinham avistado o monstro. O rapaz suspirou aliviado e prosseguiu em sua busca.
Caçadores costumam desenvolver instintos mais aguçados, então subitamente se abaixou. O estampido de um tiro soou às suas costas, ele virou, apoiou um joelho no chão e apontou sua pistola.
A coisa apontava seu revólver para ele. O rapaz ficou estarrecido como se parecia com um bebê de verdade, e observou a marca do disparo de Tatiana. Se uma bala de prata não fora suficiente, então certamente teriam que usar meios mais drásticos.
O impasse durou alguns segundos, até que as portas do elevador se abriram e dois médicos surgiram, exatamente entre os dois inimigos.
Daniel poderia jurar que viu a coisa torcer a boca em um sorriso irônico e grotesco. Gritou:
— Abaixem!
Disparou sua arma assim que os homens, assustados, se jogaram no chão após darem com o boneco armado. Um tiro o acertou na cabeça, ele caiu para trás, mas logo se levantou e correu. O jovem Caçador o seguiu o mais depressa que pôde, literalmente pulando sobre os médicos aterrorizados.
Era inacreditável que, com pernas tão curtas, a coisa possuída corresse tão depressa.
Chegou ao vão de escadas, virou-se e apontou a arma que roubara do policial para Daniel. Deu dois tiros, que errou, e ficou sem munição. Largou o revólver ali e simplesmente se jogou pelo espaço central.
O Caçador olhou para baixo, e se pôs a descer rapidamente as escadas.
Chegando ao subterrâneo manteve a arma apontada, pronto para tudo.
Uma coisa de metal brilhante passou bem próxima a sua cabeça, batendo na parede. Era um bisturi lançado pela coisa.
Daniel correu, vendo o boneco possuído metros à frente. Estavam no andar de manutenção e lavanderia, e a coisa passou por vários funcionários que se assustavam com a visão grotesca.
— Sai da frente, depressa! — o rapaz repetia.
O monstro terminou por trombar com as pernas de uma funcionária que carregava uma bandeja cheia de bisturis recentemente esterilizados e embalados.
A moça caiu, tentou se levantar assustada, mas sentiu metal apertando seu pescoço.
Daniel parou, apontando a arma.
— Calma, moça, vai ficar tudo bem. Não, não olhe!
A funcionária havia feito menção de virar o rosto a fim de ver seu agressor. Tremia de medo.
— Não tem para onde fugir, aberração — disse o Caçador. — Deixe a moça ir, que garanto pra você uma passagem indolor pro inferno.
A coisa de novo sorriu em um esgar grotesco, as marcas de tiros a tornando ainda mais abominável.
Daniel puxou a pequena cruz de pau-brasil que usava ao pescoço, a segurou e recitou uma invocação, mantendo a arma apontada. Tinha esperanças de, com aquele encantamento, diminuir a força do monstro e ao menos salvar a funcionária.
A coisa puxou outro bisturi, segurando-o acima da cabeça da moça. Daniel apertou mais a cruz, murmurando o encantamento. Estava a alguns metros de distância, e não sabia se funcionaria.
— E em nome de tudo que é bom ordeno que se renda, criatura das trevas — ele pronunciou o último verso da reza.
Daniel manteve a mira, e duvidava que conseguisse atingir o boneco sem ferir a moça. Ele viu o monstro fraquejar, o bisturi amolecer em sua mão, e pensou em atirar. O tempo estava se esgotando.
— Ei, Chucky! — uma voz feminina gritou.
Foi o que bastou. A confusão do boneco graças ao encantamento, mais a surpresa de Tatiana surgir pelo lado, fez o monstro se erguer e virar para lá. Daniel atirou, atingindo-o em cheio. Os bisturis voaram para longe da moça, que se ergueu e correu para junto do Caçador.
Tatiana também atirou, atingindo-o duas vezes. Depois correu e agarrou a coisa.
O boneco se agitava e ela mal conseguia contê-lo. Daniel veio em seu auxílio, e os dois mantiveram a coisa presa. Vó Nena, então, chamou:
— Meninos, aqui!
A Caçadora encontrara o incinerador do hospital. Eles correram para lá, enquanto o boneco se debatia furiosamente. Encontraram dois funcionários que, diante dos gritos deles, abriram a porta da fornalha.
Jogaram a coisa lá e voltaram a fechar a porta.
Tatiana e Daniel, ofegantes, se abraçaram. Nena deu uma explicação rápida aos dois moços, e os três saíram.
Encontraram Esperidião, que acabara de sair do elevador.
— Tudo resolvido, delegado — disse a Caçadora. — Fogo com essas pragas possuídas é a melhor coisa.
— E o que eu digo para a mãe...
— Mãe!? É sério que você está chamando a dona do boneco de mãe? Não incentive a loucura, Esperidião!
Os Caçadores tomaram o elevador. O casal ainda se mantinha abraçado, e Vó Nena sorriu para eles. Disse, finalmente:
— Vocês que não me inventem, hein? Eu quero um bisneto de verdade!
Tatiana sorriu, abraçando-a. Daniel, aliviado, comentou:
— Ele virá, Vó, é uma promessa!
— O que esse povo pensa!? — finalizou Nena. — Maldito bebê reborn!
Vó Nena e os Caçadores retornarão.
Para vocês verem, caros leitores. Nesta segunda metade de maio de 2025 eis que este blog literário entrou na onda do tal bebê reborn! Mas bem ao estilo de Vó Nena e os Caçadores!
Uma historinha simples que espero ter sido divertida para vocês!
Um conto maior, trazendo uma homenagem, deve ser publicado também aqui em breve, fiquem de olho!
E, novamente, estão todos convidados a conhecer a primeira trilogia deste universo de folclore brasileiro, fantasia, terror e lendas urbanas:
Vó Nena e os Caçadores: O Fusca Azul
Vó Nena e os Caçadores:O Livro Maldito
Vó Nena e os Caçadores:A Última Escrava.
Mas não se preocupem, a próxima história longa já tem cenas escritas.
E vale a pena revelar que, antes, deverá chegar mais um e-book (ou livro, torçam!) na forma de uma coletânea de contos e noveletas. Ainda estou decidindo se devo ou não escrever mais uma história para completar esse tomo. Continuem acompanhando em @renatoa.azevedo.
Obrigado por sua leitura, comentem e compartilhem, apoiem os autores brasileiros.
Até a próxima!
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